02/06/2016
Futuro da EBC em risco
Brasil 247 - 02/06/2016
Reduzi-la a uma agência de divulgação do Poder Executivo, como se cogita, será o fim da mais importante iniciativa para a democratização das comunicações, desperdiçando recursos e energias empregados para dar forma à previsão do artigo 223 da Constituição: a coexistência entre sistemas de radiodifusão privada, pública e estatal.
O governo promete uma medida provisória alterando o coração da lei da EBC. Nela, terá de dizer claramente o que pretende da empresa: comunicação pública para a sociedade ou publicidade para o governo de plantão.
Além da demissão do diretor-presidente Ricardo Melo, violando mandato garantido em lei, a intervenção atropelou o Conselho Curador (15 representantes da sociedade, quatro do governo, dois do Congresso e um dos empregados). Está em curso, a pretexto de "desaparelhar" a empresa, uma caça às bruxas que já exonerou quase 50 gestores e funcionários.
Primeira presidente da EBC, afastei-me da estatal no final de meu mandato, em 2011, retornando há três meses como entrevistadora e comentarista. Tive o contrato (modestíssimo, à prova de lorotas) suspenso numa clara seleção política que alcançou também profissionais como Luis Nassif, Paulo Moreira Leite, Sidney Rezende, Albino Castro e Emir Sader. Mas não é por isso que estou neste debate.
Presidi a diretoria inaugural que, em 2007, negociou no Congresso e implantou a empresa e a TV Brasil. Tenho responsabilidade pelo feito e compromisso com a sobrevivência do sistema público, que ultrapassa a EBC, mas tem nela o pilar central.
Em outra frente, o Ministério das Comunicações expandiu as rádios e TVs comunitárias e regulamentou as redes digitais da Cidadania, Cultura e Educação, previstas no sistema brasileiro de TV digital.
Esse conjunto formará com a EBC o sistema brasileiro de comunicação pública, não comercial e não governamental. Sobre a continuidade dessas outras ações, o governo ainda não disse nada.
A EBC explora ainda oito emissoras de rádio, sendo que algumas cobrem grandes vazios de sinal na Amazônia. Os conteúdos livres da Agência Brasil abastecem veículos nacionais e estrangeiros. Lá fora, milhões de brasileiros recebem a TV Brasil Internacional sem taxa extra de assinatura.
Por meio de unidade específica, a EBC presta ao governo serviços contratados, como transmissões da TV NBR, vitrine do Executivo similar às emissoras dos outros dois Poderes.
Com apenas oito anos de existência, a EBC não responde ainda plenamente à sua missão, mas faz diferença na paisagem. Isso explica a fúria. Muitos problemas ainda exigem solução.
A TV Brasil nunca teve rede própria no sistema analógico, pois ao nascer o espectro já fora todo ocupado por emissoras privadas. Só terá cobertura nacional no sistema digital, o que demanda tempo e dinheiro. Como elevar a audiência com tão precária distribuição?
Livres do jugo publicitário e dos interesses políticos, os canais públicos existem, aqui e em outros países, para garantir a expressão dos sem-voz e da diversidade social, política e cultural.
A EBC vem sustentando programação dessa natureza, mesmo com limitações técnicas, de inovação ou linguagem. Que emissora comercial aberta oferece tantas horas de boa programação infantil?
Caberá também à sociedade, e não só ao governo, decidir sobre o futuro da EBC: aprimorar o que foi feito ou jogar tudo fora? Essa é a questão agora.
Artigo publicado na Folha de S. Paulo
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