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13/10/2015
Doutora da PUC/SP denuncia golpe liderado por Aécio contra Dilma
Brasil 247 - 10 de Outubro de 2015 às 07:27
"Independentemente das qualidades ou defeitos do
Governo Dilma, o fato é que desde o primeiro dia do mandato presidencial
o país tem experimentado a tentativa de cunhar uma situação
justificadora para a derrubada da Presidenta e, nesse processo de
contínua construção de crise política, nossa democracia presidencialista
vai sangrando sem ter atingido a idade adulta. E, mais uma vez, o
Brasil não aceita jogar dentro das regras do jogo", diz Adriana Ancona
de Faria, PhD e professora de Direito Constitucional da PUC/SP, sobre o
movimento golpista que vem sendo liderado contra a presidente Dilma
Rousseff
247 –
Artigo da professora Adriana Ancona de Faria, PhD e professora de
Direito Constitucional da PUC/SP não deixa dúvidas: o movimento liderado
pelo senador Aécio Neves (PSDB-MG) contra a presidente Dilma Rousseff
nada mais é do que a tentativa de um golpe. Confira abaixo:
A DEMOCRACIA BRASILEIRA FORA DAS REGRAS DO JOGO - IMPEACHMENT OU GOLPE?
Adriana Ancona de Faria
Doutora em Direito do Estado e Professora de Direito Constitucional da PUC-SP
As ameaças de impeachment têm sido recorrentes desde o primeiro dia de mandato da Presidente Dilma, nesta sua última eleição.
Algumas questões foram
muito bem trabalhadas por Frederico de Almeida, no artigo que publicou
ontem, dia 08 de outubro de 2015, no blog justificando e que recebia o
nome de “Impeachment é mais político que jurídico?”.
Este artigo demonstra com clareza os aspectos jurídicos e políticos de
um impeachment, apontando que em um sistema presidencialista “o
impeachment não é exclusivamente político, e por isso não pode ser
confundido com a moção de desconfiança dos sistemas parlamentaristas,
nem com o recall que existe, por exemplo, na Venezuela e (pasmem os
críticos do “bolivarianismo”) em certos estados dos EUA. Ou seja: não
basta a má avaliação popular ou a perda de apoio parlamentar para a
interrupção do mandato; exige-se a comprovação de crime de
responsabilidade e um processo de julgamento com direito ao
contraditório, que embora seja conduzido pela Câmara (juizo de
admissibilidade) e pelo Senado (julgamento efetivo), é presidido pelo
presidente do STF (na fase de julgamento) e assume a forma conhecida dos
procedimentos judiciais. Há ainda possibilidade de impeachment por
crime comum, na qual, após a admissibilidade do procedimento pela
Câmara, o julgamento se dá pelo STF – mas essa possibilidade sequer é
cogitada no caso de Dilma Rousseff.
Isso não quer dizer,
por outro lado, que o impeachment seja exclusivamente jurídico; tanto é
que o juízo de admissibilidade e seu julgamento (no caso de crime de
responsabilidade) se dá em um âmbito essencialmente político (o
Congresso). A própria caracterização dos crimes de responsabilidade pela
Constituição tem uma margem de imprecisão que só será preenchida por um
juízo político”
Considerando as precisas
colocações de Frederico de Almeida, além da boa análise realizada no
artigo citado, tenho olhado a situação política brasileira com muita
preocupação institucional frente à nossa democracia.
É evidente que um dos
critérios básicos de um regime democrático é o respeito à soberania
popular, entendida esta como o direito do povo eleger diretamente seus
governantes. A presidente Dilma foi eleita diretamente pelo povo
brasileiro, o que garante a legitimidade democrática de seu mandato,
desde que ela não tenha incidido em algum crime, comum ou de
responsabilidade, que nos termos constitucionais justifiquem a sua
retirada do cargo. Assim como deve ser respeitado o processo
jurídico-político estabelecido pela Constituição da República do Brasil e
o conjunto normativo do ordenamento jurídico pátrio, sob o conceito de
Estado Democrático de Direito.
Pois bem, o que se
constata é que, no presidencialismo democrático definido pela
Constituição brasileira, um governante não pode perder o cargo antes de
finalizado o tempo de seu mandato, se não incorrer em crime.
Sem a ocorrência de
crime, não basta a insatisfação popular, nem mesmo a falta de base de
apoio congressual, para que o mandatário eleito seja retirado do
exercício de seu cargo. O momento político escolhido para a retirada de
um governante que demonstre falta de respaldo político-popular
restringe-se ao processo eleitoral, quando finalizado o exercício de seu
mandato. Esse não é um privilégio descabido do mandatário, mas uma
proteção à força do voto frente ao sistema de governo presidencialista. O
que se prestigia nesse mecanismo rigoroso de controle do mandato é o
respeito à escolha popular, como a única via legítima de retirada legal
do mandato de um presidente que não tenha cometido crime.
Diante dessa conclusão,
os defensores da destituição do mandato da presidenta Dilma têm tentado
caracterizar as condições legítimas de sua derrubada. A última tacada
para construção da hipótese legal foi a rejeição das contas pelo
Tribunal de Contas da União (TCU), argumentando-se pela ocorrência das
chamadas pedaladas fiscais da Presidenta em seu mandato passado, já que
nada mais conseguiram apontar contra a presidente, apesar das ações
heterodoxas do juiz Moro frente aos valores do devido processo legal, na
denominada Operação Lava-jato.
Observe-se, ainda, que as
denominadas pedaladas fiscais caracterizam-se como práticas recorrentes
de governos pretéritos, acolhidas regularmente pelos mesmos órgãos
fiscalizatórios do Estado.
Sem entrar no debate
jurídico sobre o cabimento, ou não, das contas de mandato pretérito
poderem fundamentar a hipótese de pedido de impeachment, o que me
espanta ao pensar em nossa democracia é a tranquilidade com que os
Poderes Públicos do Estado brasileiro não se intimidam em atuar de forma
seletiva na configuração de um crime.
Diariamente, frente a
enxurrada de denúncias que povoam a atuação dos representantes públicos
do País, o que se verifica de forma inconteste é que as autoridades
judiciais, ou político-fiscalizatórias do país (em harmonia com a mídia)
assumem sem inibição que o entendimento jurídico da situação ensejadora
da punição será matizado a depender daquele que realiza o ato
supostamente caracterizador do fato criminoso e não pelo fato em si.
Matiza-se a caracterização do crime, matiza-se o processamento da
demanda, matiza-se o acolhimento ou não do processo, enfim, matiza-se se
incrimina ou absolve quem se quer em qual e tal condição.
A seletividade no
entendimento jurídico de um fato, a partir de quem o pratica, indica se
há ou não estado de direito em um país. Se não há estado de direito em
um país gestando o processo de destituição de um governante
legitimamente eleito, sua derrubada será um golpe, mesmo que se empreste
do nome de impeachment. Afinal, diante dessa condição, não se aferem as
hipóteses constitucionais que possam legitimar uma eventual decisão
destituidora do mandato, mas se cria a hipótese normativa do ponto de
vista discursivo, apoiado em um ato de autoridade casuístico e
direcionado a matar o inimigo.
Independentemente das
qualidades ou defeitos do Governo Dilma, o fato é que desde o primeiro
dia do mandato presidencial o país tem experimentado a tentativa de
cunhar uma situação justificadora para a derrubada da Presidenta e,
nesse processo de contínua construção de crise política, nossa
democracia presidencialista vai sangrando sem ter atingido a idade
adulta. E, mais uma vez, o Brasil não aceita jogar dentro das regras do
jogo.
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