15/12/20215
Cunha no futuro
Paulo Moreira Leite
Será preciso aguardar por informações precisas para se avaliar todas as consequências jurídicas das operações de busca e apreensão conduzidas na manhã de hoje na casa de Eduardo Cunha, em Brasília, e em seus demais endereços, no Rio de Janeiro.
Até porque se trata de uma ação de vulto, que atinge também aliados do presidente do Senado, Renan Calheiros, e nomes importantes no PMDB, como o ministro do Turismo Henrique Eduardo Alves e o ex-ministro Edson Lobão.
As consequências políticas são claras, porém: mais cedo do que parecia, Cunha deve ser inutilizado como protagonista da tentativa de impeachment contra Dilma Rousseff e a partir de agora deverá ser forçado a cuidar da própria sobrevivência. Nesta situação, será obrigado a lutar pelo mandato, principal garantia contra um possível pedido de prisão provisória, hoje o maior temor dos acusados da Lava Jato – e da qual dificilmente poderá livrar-se caso venha a ficar sem mandato.
É de se notar que a operação ocorre dois dias depois que a Folha de S. Paulo e o Globo publicaram editoriais registrando que a situação política de Eduardo Cunha se tornara insustentável
.
“Os editoriais informam que tanto o PGR Rodrigo Janot quanto o ministro Teori Zavaski, do STF, terão respaldo de pelo menos dois dos três mais influentes grupos de comunicação do país para agir contra Cunha -- seja lá qual for o caminho legal encontrado”, escrevi aqui ontem.
A operação ocorreu 48 horas depois da publicação do editorial da Folha, 72 horas depois que saiu o do Globo. Dá para entender, certo?
Num primeiro momento, Cunha perde força no Conselho de Ética, que até agora comandava à distância, sem maiores dificuldades para exibir sua truculência, e que se reúne hoje sob impacto da novidade.
O eixo de gravidade do PMDB, que girava a seu favor – e de Michel Temer – e contra Dilma, modifica-se em outra direção, em benefício de Leonardo Picciani, aliado do Planalto.
Ainda que a biografia de Eduardo Cunha permita prever uma defesa implacável, as articulações para forçar sua substituição ganham novo impulso a partir de agora. É inevitável mas convém não alimentar um grama de otimismo.
Deixando de lado as poéticas suposições de natureza ética que, se tivessem valor real, teriam impedido a eleição de Cunha no início do ano, a questão envolve um problema político. Os partidos e lideranças que hoje têm maioria na Câmara procuram um candidato capaz de dar curso à agenda conservadora de Cunha – inclusive o impeachment de Dilma – mas sem uma biografia tão vulnerável, a ponto de ameaçar a credibilidade da denuncia em função da própria folha corrida.
A cronologia é simples. Cunha foi utilizado quando seus serviços destrutivos foram úteis para atingir Dilma. Neste momento, quando a presidente se encontra enfraquecida, planeja-se que seja substituído por um carrasco de rosto respeitável, encarregado de cumprir uma tarefa que continua essencialmente a mesma -- afastar uma presidente contra a qual não há um fiapo de prova.
Um presidente da Câmara pode deixar o cargo de duas formas. Por renúncia, o que não parece o caso.
Ou por decisão da maioria do plenário, que é soberano. A máquina política de Cunha obviamente dará novos sinais de desgaste, mas não o abandonou até aqui. Isso permite imaginar soluções intermediárias, e é possível que uma delas possa ser de seu interesse: deixar a presidência e preservar o mandato. Foi desse modo que o plenário destituiu Severino Cavalcanti, há exatamente dez anos.
No mesmo dia em que a Polícia Federal entrava na casa de Eduardo Cunha, uma massa de dezenas de manifestantes, empregando buzinas infernais, fazia um protesto em frente ao apartamento do ministro Ricardo Lewandowski. Eles querem que o STF não se envolva no debate sobre as regras do encaminhamento do pedido de impeachment na Câmara, assunto da reunião plenária de amanhã no Supremo, o que ajuda a ilustrar um pouco mais a conjuntura em que se deu a busca na casa do presidente da Câmara.
Diante das provas conhecidas contra Eduardo Cunha, não há motivo para criticar a ação.
Mas a memória democrática não permite celebrar iniciativas que, mesmo com apoio nas instâncias responsáveis, implicam em diminuir a imunidade parlamentar. É sempre motivo de preocupação, pois envolvem aquele tipo de iniciativa que todos sabem como começam -- e fingem não saber como terminam.
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