Marcha à ré em Brasília
Por Wagner Iglecias*, especial para o Maria Frô
Prezado(a) leitor(a), se alguém me
dissesse em 2003, logo que Lula assumiu a presidência, que o PT faria
quatro mandatos presidenciais sucessivos, eu apostaria que o Congresso
Nacional em 2015 estaria repleto de representantes dos trabalhadores (do
campo e da cidade), de mulheres, de jovens, de afro-descendentes, de
indígenas, de representantes do movimento LGBT, de gente das mais
variadas fés religiosas etc. Seria inclusive uma conclusão óbvia. Afinal
o que era o PT, na sua origem, se não uma grande frente de forças
políticas progressistas e movimentos sociais ascendentes, e que desde os
anos 1980 vinham dando uma lufada de ar fresco no cenário político
brasileiro?
Ok, tudo bem, o petismo em 2003 já era
bem mais pragmático que duas décadas antes. Mas o que se vê na realidade
do Parlamento brasileiro hoje é bem o contrário do que se podia supor
após uma década e meia do partido no poder. Câmara e Senado estão
dominados por homens adultos brancos, em sua maioria conservadores em
termos políticos e morais, em sua maioria cristãos e em sua ampla
maioria financiados por grandes grupos econômicos. De duas uma: ou a
direita, consciente de sua inviabilidade eleitoral na disputa pela
presidência da república, resolveu priorizar o Legislativo, ou o petismo
vacilou muito em sua estratégia conciliadora e agora vê um Congresso
Nacional dominado por seus adversários.
Muita gente tem saudado o ativismo desta
atual legislatura, mas fato é que a Câmara tem votado diversas
propostas que alteram a Constituição Federal sem que uma assembleia
nacional constituinte fosse instalada. E sem diálogo com a maioria da
sociedade. A recente votação, a toque de caixa, da reforma política
conseguiu piorar um sistema eleitoral e partidário que já é muito ruim.
Do jeito que ficou só se favorecerão as oligarquias partidárias e seus
sócios e financiadores do mundo empresarial. Agora a Casa prepara-se
para aprovar a redução da maioridade penal e em breve o Senado deverá
alterar o regime de exploração do pré-sal, desmontando a regra da
partilha e na prática reinserindo o sistema de concessão das jazidas,
altamente favorável às petroleiras estrangeiras.
Mais do que uma birra contra um governo
notadamente fraco, ou mais que o resultado de uma articulação política
malfeita entre os dois Poderes, o que o Parlamento brasileiro está
perpetrando neste momento é um profundo contra-ataque aos avanços
sociais e políticos que o país conheceu nos últimos anos. E por últimos
anos entenda-se não só aqueles dos governos petistas, mas sim o que
conseguiu-se construir, a duras penas, desde a volta da democracia, em
meados da década de 1980.
*Wagner Iglecias é sociólogo, professor da Escola de Artes, Ciências e Humanidades da Universidade de São Paulo.
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