13/07/2016
“Um público tão vil como a imprensa que o formou”
Brasil 247 - - 13/07/2016
Paulo Moreira Leite
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Este diagnóstico sobre os efeitos do jornalismo "cínico, mercenário, demagógico e corrupto" ajuda a entender a mais recente dificuldade de Michel Temer e Henrique Meirelles para aplicar um arrocho sobre os brasileiros. Para surpresa de quem não aprendeu a separar a teoria da prática dos profetas do Estado mínimo, Meirelles cogita elevar impostos. Mas, Ibope na mão, que informa que 81% da população é contra o aumento, Temer resiste -- pelo menos enquanto o Senado não anunciar a decisão final sobre o afastamento de Dilma.
A postura de Temer é o reconhecimento do óbvio: uma medida impopular dessa natureza pode provocar uma reação indignada de brasileiros e brasileiras, repetindo as cenas constrangedoras que já marcaram os primeiros dias de gestão do vice presidente em exercício, fosse para defender os direitos das mulheres, fosse para manter conquistas culturais da última década e meia.
É claro que um governo que pretende reformar a previdência, sonha em transformar a CLT em puro enfeite de museu e privatizar tudo aquilo que o dinheiro puder comprar, pagando barato, não merece confiança de ninguém na hora em que pede mais sacrifício à população.
Há bons motivos para se suspeitar da velha prática de Robin Hood ao contrário: tirar dos pobres para engordar o bolso dos ricos.
A dificuldade não é só essa, porém.
No esforço para desmontar os direitos sociais inscritos na Constituição de 1988, trabalho que teve início 24 horas depois que o deputado Ulysses Guimarães proclamou a nova Carta, a mídia grande passou as décadas seguintes empenhada numa campanha ideológica grotesca, no melhor estilo denunciado por Pulitzer. Interessada não só em desmontar o embrião de Estado de bem-estar construído durante décadas, mas também em impedir qualquer progresso posterior, nossos jornais e tele-jornais deram os braços numa grande campanha deseducativa, para demonizar todo e qualquer tipo de imposto e cobrança feita pelo Estado. Seu horizonte era o Impostômetro.
A ideia era clara: convencer os brasileiros que o simples ato de
entregar dinheiro para o Estado seria um erro em si. Na melhor das
hipóteses, era um desperdício. Na pior, um estímulo ao roubo. A noção,
construída dia após dia, linha atrás de linha, uma página depois da
outra, era que o Estado, sob qualquer governo, qualquer orientação
política, alinhado com qualquer interesse social, não passa de um
aglomerado de burocratas e aproveitadores sem escrúpulos, incapazes de
defender qualquer interesse socialmente relevante. A receita serviu como
uma luva quando se tratava de combater programas sociais importantes do
governo Lula-Dilma, como o reajuste do salário mínimo, o Bolsa Família
e, acima de tudo, a CPMF, destinada a dar um reforço indispensável a
saúde pública. Criada por Adib Jatene no governo Fernando Henrique, não
sobreviveu muito tempo, pois era inaceitável que auxiliasse Foi abolida
em ambiente de carnaval em 2007, quando se queria impedir de todas as
maneiras que os governo do PT e seus aliados ampliassem os serviços
que o Estado poderia oferecer gratuitamente. Antes, como agora, a
questão é dar espaço para o setor privado.
Não é de surpreender, assim, que a resistência à elevação de impostos seja imensa. E inclui boa parte dos eleitores de classe média que foram as ruas defender o impeachment. Como não sentir o engano, a patranha?
O risco de uma reação não é pequeno. Madrinha do moderno Estado mínimo, a primeira-ministra Margaret Thatcher entrou em declínio quando decidiu reforçar o caixa com a cobrança da Poll Tax, um imposto residencial que atingia moradores de bairros ricos e pobres. O saldo foi uma insurreição que se prolongou durante meses e terminou com a renúncia da primeira-ministra. Em seu primeiro discurso, o novo primeiro ministro, John Major, informou que desistira da Poll Tax.
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