quinta-feira, 14 de julho de 2016

Nº 19.566 - "Janio de Freitas: Moreira no paraíso das privatizações"

 

14/07/2016

Janio de Freitas: Moreira no paraíso das privatizações

angoravoador


Por

Moreira Franco é destes personagem que só a política brasileira produz: o conspirador profissional.
Invoco o insuspeitíssimo testemunho  da Eliane Cantanhêde, que publicou, há 15 anos, o texto Moreira Franco, o curinga de FHC que “conspira” demais, onde o “personal consultant” é objeto de uma curiosa revelação:
“O ex-senador Antonio Carlos Magalhães (PFL-BA) contou que FHC lhe confidenciou que não confiava em Moreira para cargos que tivessem “cofre”. À Folha, o presidente rebateu: “Tudo isso é mentira. Falam, falam, mas não provam nada. Alguém provou algo contra o Moreira? Nunca”.

Por falta de pistas, como esta que o une agora à concessão à Andrade Gutierrez do Aeroporto de Confins, em Belo Horizonte, é que não foi.

Do personagem, Janio de Freitas, que o conhece há décadas, narra a história sobre como não faltaram provas de sua ação. Faltou, sim, investigação e responsabilização.

Estrelas em cena

Janio de Freitas, na Folha


Coincidência ou não, duas estrelas de distantes escândalos em concorrências públicas emergem ao mesmo tempo, em casos separados, da Lava Jato para o noticiário. Não por coincidência, mas pela mesma tradição, a empreiteira agora citada como uma das figuras estelares era coautora e beneficiária, entre outras, das concorrências corrompidas.

Márcio Fortes “surge nas negociações das delações premiadas das grandes empreiteiras”, como noticiou Mônica Bergamo, na condição de intermediário de ao menos um político e empresários –todos sabemos para quê. É a função que teve na montagem daquelas concorrências, o que está bem explicitado em atas de reuniões, com sua presença, escritas na empreiteira e preservadas fora dela (não era uma só a fazê-las).

Responsável no governo Dilma Rousseff pelos leilões de aeroportos para consórcios privados, Moreira Franco –noticiou “O Estado de S. Paulo”– aparece em numerosas mensagens trocadas com o então presidente da empreiteira Andrade Gutierrez, Otávio Azevedo. Seu assunto: a privatização do aeroporto internacional de Confins, junto a Belo Horizonte. Moreira reúne-se com dirigentes da empresa mineira na própria casa de um deles. A Andrade ficou com Confins. Como esperado, Moreira Franco nega a notícia e qualquer irregularidade no leilão.

Negou-as também, quando governou o Estado do Rio, nas numerosas licitações das obras do metrô, do grande complexo Marajoara de abastecimento de água, do Palácio da Polícia, por exemplo. Fraudes, todas, comprovadas aqui mesmo, com a publicação antecipada e camuflada de cada resultado. Houve inquéritos, inclusive na polícia estadual, mas para não chegar a resultado. Todas aquelas concorrências, porém, precisaram ser anuladas. Algumas para sempre.

Depois de longo sumiço, Moreira Franco reapareceu como ministro da Secretaria de Aviação Civil, no governo Dilma, a pedido de Michel Temer. Foi uma das nomeações mais inadmissíveis de Dilma, que não podia, de qualquer ponto de vista, desprezar o histórico implícito na indicação. No Planalto, Michel Temer confirma sua identificação com Moreira Franco: deu-lhe, em seu governo, o encargo das privatizações, das concessões e das parcerias com os interesses privados. O equivalente a certo paraíso.

O governo Moreira Franco e suas licitações estouradas deram-se na passagem dos anos 1980 para os 90. Lembrando-as há pouco no “Jornal da Band”, a propósito das empreiteiras na Lava Jato, Ricardo Boechat citou aquela fase com a fraude revelada da Ferrovia Norte-Sul, para esta conclusão: se aquelas fraudes fossem punidas, não haveria a corrupção movida pelas empreiteiras nesses anos todos, e que se mostra em parte na Lava Jato. Uma constatação que mostra a responsabilidade, também, das chamadas “autoridades competentes”, embora nem tanto.

Caso mais rumoroso, a fraude na Norte-Sul teve um inquérito da Polícia Federal acompanhado por um procurador. A PF ciscou para um lado e outro, mas o procurador, de início muito hostil ao trabalho jornalístico e ao próprio jornalista, no fim concluiu pela necessidade de denúncia criminal e processo contra autores e beneficiários da licitação fraudada. O inquérito foi mandado para o Rio. O (ex-)procurador Juarez Tavares enfurnou-o. Passado um ano, o então procurador-geral Sepúlveda Pertence despachou-o em silêncio para o arquivo morto. Foi nomeado ministro do Supremo Tribunal Federal.
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