quarta-feira, 19 de abril de 2017

Nº 21.260 - "Por que Janot blindou Temer?"

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19/04/2017

Por que Janot blindou Temer?



Brasil 247 - 18 abril de 2017




Tereza Cruvinel


Juristas e políticos estranharam que o procurador-geral Rodrigo Janot tenha se antecipado a um juízo do STF e acolhido em seus pedidos de investigação o entendimento de que Temer não pode ser investigado.  Em 2015, o falecido ministro Teori Zavascki, em resposta a consulta do PPS sobre eventual investigação de Dilma, decidiu que sim, o presidente pode ser investigado,  embora não possa ser “responsabilizado”, vale dizer, não pode ser processado e julgado, por “atos estranhos ao exercício do mandato”. O ministro relator da Lava Jato no STF,  Edson Fachin,  acolheu a tese de Janot e deixou Temer fora de sua lista. Mas dentro de 15 dias ele deve responder ao agravo do PSOL, pedindo que se aplique a Temer a interpretação de Teori. Por que Janot blindou Temer? Muita gente acha que por ainda desejar a recondução ao terceiro mandato.

A ação do PSOL foi impetrada junto ao  inquérito, derivado da delação do executivo da Odebrecht Marcio Farias, que se refere à participação de Temer numa reunião, em seu escritório,para discutir o pagamento de uma propina de R$ 40 milhões (em 2010).   No inquérito 4462, em que  trata da delação de pagamento de  propina de R$ 4 milhões a Moreira Franco/Eliseu e a Padilha por favores à Odebrecht na concessão do aeroporto do Galeão, bem como do pedido de R$ 10 milhões feito feito a Marcelo Odebrecht  no Palácio do Jaburu, Janot não economiza referências aos indícios de participação de Temer no esquema de arrecadação do PMDB. Entretanto, no final ele se antecipa ao STF afirmando que o presidente não pode ser investigado, com base no artigo 86 da Constituição, pedindo que apenas Moreira e Padilha o sejam.

       
Vejamos algumas das coisas que Janot disse em sua petição ao ministro Luiz Fachin:


1. “Há fortes elementos que indicam a prática de crimes graves, consistente na solicitação por ELISEU PADILHA e MOREIRA FRANCO de recursos ilícitos em nome do Partido do Movimento Democrático Brasileiro -PMDB- e de MICHEL TEMER, a pretexto de campanhas eleitorais.”

 2. Como se verá, a narrativa dos colaboradores e os elementos de corroboração apontam para a obtenção ilícita de recursos para o grupo político capitaneado por MICHEL TEMER que, atualmente, ocupa o cargo de presidente da República. À época dos fatos — de março a setembro de 2014, TEMER ocupava a vice-presidência da República.”

 3. Cláudio Mello Filho, diz Janot, discorrendo sobre suas relações com o PMDB da Câmara, diz que o grupo é “historicamente liderado por MICHEL TEMER e capitaneado por três nomes: MICHEL TEMER, ELISEU PADILHA e MOREIRA FRANCO. Ao longo dos anos, o colaborador percebeu que a pessoa mais destacada desse grupo para entabular negociações com agentes privados e centralizar as arrecadações financeiras da Odebrecht era ELISEU PADILHA, que atuava como verdadeiro preposto  de MICHEL TEMER...”

 4.  “O grupo politico permaneceu em funcionamento de forma concertada após a assunção por parte de MICHEL TEMER da 9 de 58 PGR vice-presidência da REPÚBLICA.”

 5. Mas diz Janot, apesar de tudo isso:  “Ressalte-se que ao longo desta petição há menção de participação do atual presidente da República Michel Temer, sendo certo que ele possui imunidade temporária à persecução penal, conforme entendimento do Supremo Tribunal Federal”.

 Muitos juristas discordam do “sendo certo”, até porque o plenário do STF nunca se manifestou a respeito.      

 O procurador-geral justifica a blindagem:  “ A Constituição da República é expressa ao consignar, no artigo 86, 5 4°, que: Art. 86 - Admitida a acusação contra o Presidente da República, por dois terços da Câmara dos Deputados, será ele submetido a julgamento perante o Supremo Tribunal Federal, nas infrações penais comuns, ou perante o Senado Federal, nos crimes de responsabilidade. [...] § - O Presidente da República, na vigência de seu mandato, não pode ser responsabilizado por atos estranhos ao exercício de suas funções. (grifos acrescidos) Significa que há impossibilidade de investigação do presidente da República, na vigência de seu mandato, sobre atos estranhos ao exercício de suas funções.”

 Janot se ampara, em seguida, em parecer do ex-ministro do STF Sepúlveda Pertence emitido em 2003. Mas há quem ache que  Sepúlveda disse outra coisa, ao escrever: “O que o art. 86, § 4°, confere ao Presidente da República não é imunidade penal, mas imunidade temporária à persecução penal: nele não se prescreve que o Presidente e irresponsável por crimes não funcionais praticados no curso do mandato, mas apenas que, por tais crimes, não poderá ser responsabilizado, enquanto não cesse a investidura na presidência. “  Vale dizer,     Sepúlveda não disse nada diferente do que disse Teori:  que o presidente pode ser investigado mas que não pode ser responsabilizado  enquanto ocupar o cargo.

 De todo modo, a manifestação de Teori Zavascki, admitindo a investigação do presidente, é muito mais recente (2015) e não foi citada por Janot; É nela que se baseia o pedido do PSOL; Fachin deve responder em 15 dias mas o plenário não tem prazo para se manifestar..  O PSOL promete marcar cerrado.

Quanto a Janot, seus críticos acham que poupou Temer apostando na recondução ao terceiro mandato. Caso ele venha a encabeçar a lista tríplice oriunda da votação da categoria, Temer poderia reconduzí-lo com a boa desculpa de que está observando a tradição criada a partir do governo Lula, de indicar o mais votado da lista. Suposições à parte, ele poderia ter delegado ao STF a decisão sobre investigar ou não o presidente sobre quem encontrou tantos indícios de participação em atos ilícitos, e mais gritantemente, na delação que fala de sua participação em encontro que discutiu propina de R$ 40 milhões.



TEREZA CRUVINEL. Colunista do 247, Tereza Cruvinel é uma das mais respeitadas jornalistas políticas do País.

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