quarta-feira, 7 de março de 2018

Nº 23.566 - "FHC: 'Se pudesse reviver a história, tentaria me aproximar não só do Lula, mas de forças progressistas em geral' "

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03/06/2018

FHC: “Se pudesse reviver a história, tentaria me aproximar não só do Lula, mas de forças progressistas em geral”



Do Diário do Centro do Mundo - Postado em 7 de março de 2018 às 8:01 am




Fernando Henrique Cardoso deu uma longa entrevista a Fernando Grostein Andrade, irmão de Luciano Huck por parte de mãe. Está publicada na Folha de S. Paulo. Fernando Henrique, como sempre, contraditório, mas bem falante. E no muito que fala, existem pontos importantes. Um deles é o que diz respeito a seu arrependimento de não ter se aproximado mais de Lula e do PT. E também o contrário. É verdadeiro. Tanto o PT quanto o PSDB deixaram um ao outro nas mãos dos partidos fisiológicos. Seguem alguns trechos da entrevista:

Fernando – Mas você não acha que existe seletividade da justiça? Não só perante o PT, PSDB, mas também, você vê que o PSDB é formado mais pela elite enquanto o PT tem uma vocação que, tem muitas pessoas da elite, mas também tem muitas camadas populares. A justiça brasileira inocentou os PMs do massacre do Carandiru. Mandou uma moça que roubou um Shampoo para a cadeia para cumprir vários anos. Você acha que a régua que a justiça e a sociedade medem os equívocos de corrupção do PSDB é a mesma que a do PT? De certa forma isso tá colaborando para a corrosão da democracia?

FHC –  O que você disse é verdade, a justiça é de classe, seletiva. Se você for negro você vai pra cadeia mais depressa do que se você for branco, ainda mais na área de droga. Isso é indiscutível. Mas o Lava Jato fez o oposto. Botou na cadeia gente rica, muito rica e poderosa, muito poderosa, de todos os partidos.


Fernando – Mas a intensidade que a Lava Jato centrou fogo no PT foi muito desigual ao escândalo dos trens do PSDB.

FHC – O que do PSDB? Os trens de metrô? Aquele negócio de metrô não tem ligação com o PSDB. Ele não recebeu dinheiro daí. Pode ser que alguma campanha tenha recebido, eu não sei. Nem foi o governador. Não tá metido, não tem. É diferente. Alguns partidos entraram mais profundamente num jogo, sobretudo os que tinham poder federal. Eu não vou negar que nos estados tenham feito a mesma coisa. Mas como tudo, no Brasil. Nas prefeituras também. Nas prefeituras nem se sabe. Nos estados sabe menos e no nacional sabe mais. Porque a mídia é mais nacional. O que dá relevo não é justiça, é mídia. Dá relevo ao que aparece. Não é que esteja perseguindo um ou outro. Agora, dizem “Não tem ninguém do PSDB”, o Eduardo Azeredo foi condenado! Qual é a diferença? É que a lei da ficha limpa é mais recente. E ela justamente foi feita pra que? Pra evitar que com o tempo tudo prescreva. Só que o Eduardo não entrou na ficha limpa e no tempo dele não havia ainda essa decisão que tá ainda na dúvida sobre a partir da segunda instância pra cadeia ou não. Mas tá condenado né? Qual é o outro que foi acusado? Quem foi inocentado? O que acontece é que a justiça é lenta. Uma das críticas persistente no Brasil é de que a justiça é lenta. Por que o foro privilegiado provocou tanta onda? Primeiro que houve excesso. Tem 28 mil, 30 mil pessoas que têm foro privilegiado, segundo que o foro privilegiado quando foi pensado foi para proteger a instituição, poder público, para proteger a pessoa. Se você é presidente e dá um tiro em um amigo e mata, é crime comum. Não é foro privilegiado. Isso o tribunal vai resolver, tá decidindo.

(…)

Fernando – Mas de maneira geral, você considera a justiça brasileira seletiva?

FHC – Isso eu considero. Socialmente seletiva, não partidariamente.

Fernando – Mas você acha que por ela ser seletiva de classe, e o PSDB?

FHC – Eu acho que não chega a esse ponto. Estão acusando todo mundo, gente. O Aécio não tá com processo? O Serra não tá com processo? Todos com processo. Agora, não foi julgado. São da mesma natureza dos processos que levaram muitos do PT para a cadeia, não. Porque eles não quiseram essa conexão sistemática entre o dinheiro público que passa ao privado que passa pro partido. Não houve isso. Aqui o que houve é o seguinte: campanha eleitoral. As campanhas eleitorais no Brasil foram frequentemente financiadas pelo setor privado. Ao caixa um e caixa dois. O Lula quando foi acusado pela primeira vez do mensalão em Paris deu uma declaração: “Isso não é nada porque é caixa dois”. Não é isso? Era considerado assim. Caixa dois é crime, eu sei que é, mas não é o mesmo crime. O uso de dinheiro não declarado para campanha eleitoral. Tudo bem, é crime, tá capitulado, não pode. Porque faz isso? Ou porque a empresa tem caixa dois e quer se livrar do caixa dois, ou porque o partido não quer dizer que recebeu da tal empresa, ou porque alguém roubou. Tem que separar essas condições. Outra coisa que aconteceu a partir do mensalão é organizar um sistema de corrupção. Nomear gente porque vai pra tal posto e tal posto para pegar dinheiro e isso vai pro partido, manter o partido no poder. Mais grave que isso é uma corrupção da democracia.

Quando o Roberto Jefferson abriu a caixa de pandora: “Olha isso aqui, tão pagando para manter o voto aqui no congresso, e estão pagando deputados.” Não foi campanha eleitoral. Não tô dizendo que campanha eleitoral pode, estou dizendo que era usual. E estou dizendo isso com tranquilidade. Primeiro que na minha campanha eleitoral comparada com as de hoje não custou nada. A última campanha custou, declarado, 44 milhões de reais. O PT declarou que era 2 milhões. Não queria dizer de onde veio. Estou dizendo que em geral, as campanhas, tradicionalmente, era aceito isso. Deixou de ser aceito. A sociedade mudou. Ela é mais exigente, é bom isso. Agora você não pode fazer um anacronismo, julgar o passado pelo presente.

(…)

Fernando – Mas você considera ele (Lula) um líder importante?

FHC – Sem dúvida. Não só isso, eu já disse mais de uma vez. O Lula veio bem de baixo. Eu conheci o Lula na casinha dele, operário. Ele e a Marisa. Estive na casa dele mais de uma vez. Jantei com Lula lá perto do sindicato. Participei das greves, todo esse negócio. O Lula vem daí e ele é um negociador, um líder sindical. Nunca foi de esquerda, não foi mesmo. Nem de direita. Era um homem pragmático que tinha um lado que era o lado do sindicato.

Chegou a presidência. Isso é bom? Para o Brasil sim. Mostra mobilidade política, social. Eu votei nele, não. Eu queria o Serra. Mas quando ele ganhou, respeitei o resultado.  Além disso o Lula fez coisas. Tudo o que ele fez, o que eu fiz, ele disse que era porcaria e fez mais ou menos parecido. A bolsa-escola virou bolsa-família. Eles eram contra, ficaram a favor e tal. Tinha que respeitar as regras do jogo cambial. Reforma agrária foi feita no Brasil por duas pessoas. Duas pessoas não, dois governos. O do Lula e o meu. Antes também o Sarney tentou. Mas quem distribuiu terra, ninguém sabe o quanto de terra foi distribuído. É uma barbaridade! Mas fui eu e o Lula quem fizemos. O MST ajudou, porque faz barulho, ocupa terra, não pode, não deixa, mas chama atenção. Então o Lula fez várias coisas que eu acho positivas. A história vai registrar e você não apaga a história. Apagaram Trotski, bom aqui não se trata disso. Não vai apagar a história dele, nem a minha, nem a da Dilma. A história tá lá. A história julga e muda de opinião. Alguém que é herói de uma época passa a ser bandido na outra. Então tem que preocupar com você mesmo. Com sua consciência, sua disposição. Fez ou não fez e tal. Conseguiu, não conseguiu, tudo bem. Acho que a cabeça do Lula mudou. Um exemplo simples: Quando eu terminei o governo, estava inimistado com a maioria dos líderes locais. Que eram patrimonialistas, os chefes locais. Que com o tempo foram rompendo porque fui tentando afetar aqui, afetar ali. O Lula, quando terminou o governo dele, ele trouxe o Sarney para São Bernardo. Eu sou amigo do Sarney e gosto dele, uma pessoa agradável, fomos colegas na Academia de Letras. Também fez suas coisas positivas e negativas assim como eu. Mas o Lula, simbolicamente, se juntou com a política mais tradicional do Brasil. Ele veio em nome do novo. Ele fez algo de novo, mas ele se juntou com a política mais tradicional. Isso não foi bom. Seria melhor que tivesse se marcado mais. Porque o PT e o PSDB nunca se juntaram? Nem quando tá lá no Congresso a coisa é positiva. Por disputa de poder, não por disputa ideológica. Se tivéssemos mais capacidade de diálogo, teria sido melhor. Não considerar como inimigo. Lembro que estava nos Estados Unidos. Tinha recebido um prêmio. O Zé Dirceu deu uma declaração que era melhor eu cuidar dos meus livros e meus netos. Por que? Achavam com razão, que o competidor era o PSDB, mas não precisava tirar o tapete. Disseram uma porção de coisas e tal. Mas é a vida política. Se eu pudesse reviver a história eu tentaria me aproximar não só do Lula, mas de forças políticas que eu achasse progressistas em geral. Que ajudasse a governar. E acho que o PT deveria ter feito a mesma coisa. Estou dizendo, fui lá almoçar. Eu gosto de Fernando Haddad, vou votar no Fernando Haddad se ele for candidato? Não vou, mas eu tô dizendo que ele é uma pessoa correta.


(…)

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