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22/07/2013
Pela livre circulação de pessoas
Da Carta Capital - 22/07/2013
É estranha a reação violenta dos médicos contra a
vinda de profissionais de outros países. Mais parecem representantes da
extrema-direita xenófoba
Valter Campanato/ABr
Há algum tempo, o governo tem discutido a possibilidade de incentivar médicos estrangeiros a atuar no Brasil. Com as manifestações de junho, tal ideia entrou na pauta das prioridades. Ela foi a única resposta do Executivo à indignação popular contra um sistema público de saúde que sofre brutalmente de subfinanciamento. Todos conhecem a sina de problemas de infraestrutura, pessoal e baixos salários que atinge a saúde pública brasileira, ainda mais depois do fim da CPMF. Sem fonte suficiente de financiamento, a saúde pública parece fadada a ser um dos setores em que a falência do nosso modelo econômico fica mais evidente.
É de causar estranheza,
porém, a reação violenta dos médicos contra a vinda de profissionais de
outros países. São compreensíveis as manifestações que procuram insistir
na maior amplitude dos problemas da área e que fazem questão de lembrar
que ainda há muito para ser feito. Mas não é compreensível que isso
sirva de justificativa para manifestações contra a possibilidade de
estrangeiros serem chamados para trabalhar no Brasil.
No fundo, talvez sem perceber, os médicos acabam por
protagonizar passeatas a favor dos “brasileiros, primeiro” que mais
parecem saídos do álbum de família da extrema-direita xenófoba comum no
mundo desenvolvido. Não é possível admitir nenhuma forma de reserva de
mercado de trabalho, pois ela quebra um princípio caro à vida
democrática: a livre circulação de pessoas. Pois durante muito tempo
vimos com os olhos da indignação como países europeus e norte-americanos
impediam indivíduos à procura de trabalho de circular livremente,
tratando-os como criminosos em potencial. Muitos brasileiros e
latino-americanos foram vítimas dessas práticas deploráveis. Por isso,
não há razão alguma para repetirmos tais ações em nosso País.
Na verdade, achamos natural uma situação
em que o capital tem direito à livre circulação e as pessoas têm
circulação restrita. O capital pode transitar de um país a outro em
qualquer momento, assim como os produtos, isso ao menos segundo os
preceitos liberais da economia. Já os seres humanos devem obedecer aos
limites da fronteira e ficar onde estão, a não ser se queiram fazer
turismo ou trabalhem em áreas estratégicas para outras nações. Melhor
seria se o inverso fosse realidade, ou seja, que o capital tivesse
circulação restrita e os cidadãos tivessem liberdade de viver suas vidas
onde quisessem.
Nesse sentido, o problema da validação do diploma poderia
ser resolvido de maneira simples. Há uma confusão do Ministério da
Educação em relação ao assunto. Ele diz respeito tanto a diplomas de
graduação quanto àqueles de mestrado e doutorado. Veja o caso dos
títulos de mestrado e doutorado. Se alguém faz uma tese em outro país,
por exemplo, o ministério exige um pedido de validação de diploma em
alguma universidade brasileira. Tal universidade comporá então uma
segunda banca para avaliar a tese que já foi objeto de uma banca de
avaliação em outro país. Nada mais irracional e corporativista. Muito
melhor seria se o ministério estabelecesse, de uma vez por todas, uma
lista das universidades consideradas compatíveis com o nível de
exigência das universidades brasileiras, o que simplificaria em muito o
processo de validação.
Com essas pequenas ações e
reações acabamos por decidir o rosto do país que queremos. Não haveria
nada pior do que utilizarmos a justa indignação contra condições
aviltantes de trabalho e de infraestrutura para escondermos um estranho
sentimento segregacionista que, em alguns casos, foi alimentado por
reações dignas do Comando de Caça aos Comunistas (CCC), pelo fato de boa
parte dos médicos a ser chamados ter nacionalidade cubana. Uma
sociedade rica é uma sociedade que acolhe aqueles que procuram refazer
suas vidas em outro lugar e auxiliar na construção do desenvolvimento
social.
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