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01/10/2016
Para promotor, Lava Jato usa métodos absurdos e polêmicos
Jornal GGN
- Em artigo, o promotor de Justiça Antonio Alberto Machado aponta
polêmicas na Operação Lava Jato, afirmando que é um “verdadeiro absurdo”
que as delações premiadas sejam obtidas com a prisão ou ameaça de
prisão. Para ele, quando a delação é conseguida através de tortura
física e psicológica, “ela deixa de ser esponstêna e se transforma numa
prova ilícita”, vedada pela Constituição.
Machado também critica a condução
coercitiva do ex-presidente Lula, a prisão - e depois a revogação desta
ordem por considerá-la “desnecessária” - do ex-ministro Guido Mantega, e
também outros expedientes autorizados pelo juiz Sergio Moro, como o
grampo no escritório de advogados de defesa.
Leia o artigo completo abaixo:
Do Avesso e Direito
Simplesmente assustador
Por Antonio Alberto Machado, promotor de Justiça de São Paulo
"HOJE,
qualquer opinião que se emita sobre a operação Lava Jato – seja a favor
seja contra, seja de crítica seja de apoio -, será sempre entendida e
julgada pelo viés ideológico. Não adianta negar – o país ficou dividido
entre os que aprovam e os que reprovam essa operação, na mesma medida
que se dividiu entre os que apoiavam e os que reprovavam o governo
petista. Mas, sejam lá quais forem as ideologias e as preferências
políticas de cada um, algumas coisas na operação Lava Jato são muito
polêmicas, tanto do ponto de vista político quanto jurídico – e algumas
constituem verdadeiros absurdos.
Se não, vejamos.
É
polêmico – e, para mim, um verdadeiro absurdo – que as delações
premiadas no âmbito da Lava Jato sejam obtidas mediante prisão ou ameaça
de prisão. A essência desse instituto, e o que o faz tolerável, é a
espontaneidade do delator. Quando a delação é obtida mediante tortura
física e psicológica – e decerto que a prisão e a ameaça de prisão
constituem suplício físico e psicológico – ela deixa de ser espontânea e
se transforma numa prova ilícita – expressamente vedada pela
Constituição Federal.
É
polêmico – e, para mim, outro absurdo – que os advogados dos réus na
Lava Jato só tenham acesso ao conteúdo das delações feitas contra seus
clientes na véspera das audiências, dificultando-lhes a articulação e o
exercício do direito de defesa; e isso quando a Lei Maior assegura
exatamente o contrário, isto é, assegura a todos os réus o direito ao
contraditório e à ampla defesa – tal como impõe o "devido processo
legal" consagrado na Constituição Federal.
É
polêmico – e, para mim, autêntico absurdo – que o juiz da Lava Jato
tenha mandado conduzir coercitivamente um ex-presidente da república até
uma repartição policial sem intimar previamente o conduzido para
comparecer perante a autoridade de polícia. Essa condução constrangedora
só tem lugar quando o conduzido teima em não atender à intimação da
autoridade – do contrário, é uma medida que ofende abertamente o direito
de ir e vir consagrado na Constituição Federal.
É
polêmico – e, para mim, mais um absurdo – que esse mesmo juiz tenha
determinado a interceptação ilegal de uma conversa telefônica entre uma
presidenta e um ex-presidente da república, e, depois, tenha revelado
através da mídia o conteúdo dessa conversa, com o claro propósito de
influenciar no delicado jogo político por que passava o país às vésperas
de um processo de impeachment – essa divulgação é crime e ofende o
sigilo das comunicações telefônicas consagrado na Constituição Federal.
É
polêmico – e, para mim, um rematado absurdo – que o juiz da Lava Jato
tenha mandado "grampear" o telefone dos advogados de réus, e do defensor
de um ex-presidente da república, malferindo assim a inviolabilidade
dos escritórios de advocacia, o direito de defesa, o direito de ampla
defesa, o direito ao livre exercício da profissão de advogado e o
princípio da lealdade processual – tudo isso configura afronta à lei e
aos ditames da Constituição Federal.
É
polêmico – e, para mim, outro absurdo – que esse juiz tenha cometido
essas arbitrariedades todas, tenha reconhecido publicamente que as
cometeu, e, em seguida tenha sido "perdoado" pelo Supremo Tribunal
Federal, mesmo depois de o ministro relator do processo da Lava Jato no
STF ter afirmado, nos autos e por escrito, que a atitude do juiz
"comprometia um direito fundamental" de dois ex-presidentes da república
– aliás, um direito fundamental consagrado na Constituição Federal.
É polêmico – e, para mim, um flagrante
absurdo – que o juiz da Lava Jato tenha mandado prender um ex-ministro
de estado do governo petista, e, menos de cinco horas depois, porque
descobriu que a mulher do ex-ministro estava sendo internada com câncer,
tenha revogado essa prisão por considerá-la desnecessária – isso viola o
direito constitucional de liberdade, a dignidade humana, e a presunção
de inocência consagrados na Constituição Federal.
É polêmico – e, para mim, absurdo também
– que o juiz da Lava Jato tenha feito aliança com a mídia empresarial
para exercer melhor suas funções de magistrado, e, por força dessa
aliança fizesse "vazar" informações ao mais poderoso grupo de mídia do
país, com o insofismável propósito de predispor a opinião pública contra
os réus que ele (juiz) mandava prender – isso viola o sigilo das
delações, o direito à privacidade e o princípio da presunção de
inocência inscritos na Constituição Federal.
É
polêmico – e, para mim, outro injustificável absurdo – que um juiz de
direito, no exercício de suas funções públicas, faça alianças com a
mídia privada. E, além disso, aceite premiação concedida publicamente
por essa mídia, mesmo sabendo que ela é adversária dos réus da Lava
Jato, que ela não se cansa de manipular informações, e que no passado
até já apoiou ditadura militar – isso fere mortalmente o princípio
republicano e a independência do Judiciário consagrada na Constituição
Federal.
Porém, o mais polêmico (e absurdo) é ver
agora um Tribunal Regional Federal (4ª Região Sul) render-se ao óbvio e
reconhecer que as práticas do juiz da Lava Jato são realmente ilegais,
pois "escapam ao regramento" do direito. Mas, segundo esse mesmo
tribunal, apesar de ilegais, trata-se de "soluções inéditas" que devem
ser toleradas porque o processo da Lava Jato é também um "processo
inédito". Em suma, o tribunal afirma, por escrito, que o direito
aplica-se aos "casos comuns" em geral; mas, à Lava Jato aplicam-se, não a
Constituição e o direito, e sim as "soluções inéditas", ou seja, as
soluções buscadas fora do direito, ou fora do "regramento comum" – com
essa retórica canhestra, esse tribunal federal acaba de proclamar que a
lei e a Constituição não valem para o processo da Lava Jato, ou, noutros
termos, admite expressamente que esse processo tramita mesmo perante
uma lei e um juízo de exceção.
Nem
no tempo da ditadura militar isso ocorreu. É certo que os militares nos
outorgaram uma Constituição autoritária (67-69); é certo também que
eles editaram um ato de exceção (AI-5); mas, mesmo a Constituição
autoritária dos ditadores, e mesmo o Ato Institucional nº 5, valiam para
todos: igualmente, isonomicamente – coisa que não ocorre agora porque,
segundo esse tribunal federal do Sul, nem a lei nem a Constituição valem
para os réus da Lava Jato.
Isso já não é apenas polêmico, nem somente um absurdo – isso já passa a ser simplesmente assustador".
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