quinta-feira, 24 de agosto de 2017

Nº 22.153 - "Aos Golpistas de sempre, o discurso de Aranha no túmulo de Vargas"

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24/08/2017

Aos Golpistas de sempre, o discurso de Aranha no túmulo de Vargas

Vargas criou a Eletrobras, a Petrobras, o BNDES...

  

Conversa Afiada - publicado 24/08/2017


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Aranha em São Borja. Cabisbaixo, Jango (foto do genial Gervásio Batista)
Os Golpistas (são sempre os mesmos) mataram Vargas no dia 24 de agosto de 1954.
Eles não se conformam.
Vargas criou o BNDES, a Eletrobras e a Petrobras.
No enterro em São Borja, Oswaldo Aranha pronunciou uma das peças sublimes da política brasileira.
E o Brasil, hoje, está condenado a ouvir o Fernando Henrique Brasif, o Careca, o maior dos ladrões, o Ministro Gilmar Mendes e o presidente ladrão como se fossem oradores...
E homens públicos!
Conversa Afiada conseguiu recuperar o discurso de Aranha com a ajuda do amigo navegante Olimpio Cruz:
Getúlio,

não era possível os teus restos serem recolhidos ao seio maternal de tua terra, sem que antes, tendo contigo vivido os últimos dias de tua vida, eu procurasse, ante a eternidade que nos vai separar, conversar contigo, como costumávamos conversar nos nossos despachos sobre a vida, as criaturas e os destinos do Brasil. Eu estou, como todos os brasileiros, constrangido, dolorido, ferido na alma, ao ver que te arrancaram a vida àqueles que te deviam conservar para melhor sorte do povo e do Brasil. Neste momento, Getúlio, conversando com aquela intimidade boa e generosa com que nos entendíamos, quero te dizer que o povo todo chorou, chora e chorará por ti, como nunca imaginei pudesse que um povo chorar. Se é verdade aquilo que se disse, numa hora de emoção, declarando que se houvesse um processo para a cristalização da lagrima, não te enterrarias no fundo da terra de São Borja e do Rio Grande, mas, da mais alta montanha da geografia política do Brasil, porque nunca se chorou tanto, nunca um povo foi tão dominado pela dor ao perder um filho, como neste instante o povo brasileiro diante de tua morte.

Getúlio, 

saímos juntos daqui há vinte e tantos anos, íamos todos levados pelo teu sonho e teu ideal. A tua filosofia era inspirada nos humildes, nos necessitados, na assistência de quantos viviam à margem da sociedade brasileira espalhados por esta imensidão, por estas terras abandonadas e abandonados eles também em suas terras, os trabalhadores. Todos tínhamos um só sonho: era integrar o Brasil em si mesmo, era fazer com que o Brasil não pertencesse às classes dominantes, aos potentados ou poderosos e que entre nós existisse, pela condição humana, de pobres e ricos, maior igualdade e fossemos todos igualmente brasileiros. A preocupação dominante da tua vida eu não direi que era fraternal, direi que era material, porque eu o testemunhei: o teu ideal era dividir igualmente entre todos os seus filhos o carinho, o amor e a possibilidade de assistência, de vida e de futuro. O que mais te feria eram as discriminações, as separações, era este contraste horrível que só não emociona os homens que não têm formação cristã e faz com que enquanto uns vivam no gozo, no luxo e na grandeza, outros se afundem na fome, na miséria e no desespero. Conheci o teu íntimo, como talvez poucos homens puderam conhecer, porque entre os grandes títulos de minha vida, um dos maiores era a confiança do teu pensamento e do teu sentimento, a honra da tua amizade que acidentes políticos nunca modificaram, antes estreitaram e engrandeceram entre nós. Saímos daqui há vinte e poucos anos. Voltamos juntos e tenho consciência de que se tu voltas, neste momento para a terra de São Borja, para um túmulo e eu não volto para a cidade de Alegrete, ainda é por causa do teu amor, da tua generosidade e do teu desprendimento, porque sei, tenho consciência e devo dizer a todos e a todo o País, que tu morreste para que nós, os que te assistiam, os teus amigos, não morressem contigo. Devo declarar que se ainda vivemos é porque tu te antecipaste na morte, para nos deixar na vida. O teu suicídio é o grande suicídio, o suicídio altruístico, aquele que faz a mãe, e do pai pelo filho, o pai, e que foste pai e filho como ninguém, e por isso soubeste fazer pelos teus. Ninguém mais do que eu o pôde testemunhar. Todos os meus apelos eram no sentido de que a tua vida era da maior necessidade para o Brasil. Praticaste não o ato de renúncia da tua vida, praticaste a grande opção, que só os fortes sabem fazer, a opção altruística que, entre a vida e os seus prazeres e a morte, decide-se pela última. 

Se ele tivesse querido, nesta hora, meus senhores, seria mais forte do que nunca, em vida, mas não mais forte do que é agora na morte, porque a morte, é eterna e a vida passageira. Ele seria mais forte porque tinha no seio das Forças Armadas e no coração do povo, que é invencível, os elementos para resistir, dominar e vencer. Mas, procurou vencer-se a si mesmo, não derramar o sangue daqueles que sabia como disse momentos antes, os melhores, os bons, os amigos. Não foi, como se disse, o suicídio de um grande homem, tu te mataste para evitar que o novo Brasil se suicidasse e para que, de ti, da tua morte e do teu sangue, surjam, como numa transfiguração, o futuro e o destino, e nós, nos contemplando, possamos ter, neste momento, a convicção de que deste com o teu sangue a certeza de que o Brasil surgiu de ti, da tua filosofia, que será cada vez maior. E ai daquele que quiser mudar o curso dos destinos de nossa Pátria! Este destino surgirá como uma emanação deste túmulo e se espraiará pelo tempo dos tempos e por todos os horizontes, numa afirmação renovada das tuas idéias e dos teus sentimentos. Quando se quiser escrever a História do Brasil, queiram ou não, tem-se de molhar a pena no sangue do Rio Grande do Sul, e ainda hoje, quem quiser escrever e descrever o futuro do Brasil, terá de molhar a pena no sangue do teu coração. 

Getúlio, 

saímos daqui juntos. Tenho consciência de que não voltamos juntos porque tu quiseste poupar a minha vida. Naquelas horas trágicas e difíceis quando o Judas preparava um novo Cristo na História do Brasil, nós sentíamos que a traição estava às nossas portas e a negação de apóstolo e do Senhor era feita pelos que mais juravam a sua fé. Naquela hora, nós tínhamos um pacto, o pacto dos homens desta terra, o pacto dos homens dignos, que todos poderiam deixar de resistir, segundo a inspiração de suas vontades porque não queriam derramar sangue para te conservares no poder, mas nós decidimos ficar juntos de ti, porque estávamos dispostos a fazer tudo pelo Brasil, a fazer todos os sacrifícios, menos o de sermos humilhados, porque a humilhação é incompatível com a dignidade humana. Tu te antecipaste para nos poupar a vida. Não sei! As tuas decisões sempre foram as melhores, mas não sei se não fora talvez melhor para nós, termos ido juntos, já que juntos vivemos, juntos sonhamos e eu te acompanhei por toda esta tua longa vida. 

Quando, há vinte e tantos anos, assumiste o Governo deste País, o Brasil era uma terra parada, onde tudo era natural e simples, não conhecia nem o progresso, nem as leis de solidariedade entre as classes, não conhecia as grandes iniciativas, não se conhecia o Brasil. Nós o amávamos, de uma forma estranha e genérica, sem consciência da nossa realidade. Tu entreabriste para o Brasil a consciência das coisas, a realidade dos problemas, a perspectiva dos nossos destinos. Ao primeiro relance, viste que a grande maioria dos brasileiros estavam à margem e a outra parte estava a serviço das explorações estrangeiras. 

E então, este espírito que conhecemos, retemperado no drama da fronteira, se alarmou nos seus estudos e se multiplicou na generosidade de seus sentimentos. Trouxeste uma cruzada que não está marcada no tempo e não tem horizonte fixado, que é a da integração dos brasileiros pelos brasileiros no seu próprio destino. Até então o Brasil não era nada, esperava por tudo. Não havia consciência do nosso progresso. Tu ofereceste a realidade, penetraste nela, tudo deste pelo novo Brasil que há de surgir, que há de crescer e se multiplicar e, quando integrado na sua grandeza entre as maiores nações do mundo, que fatalmente viremos a ser, o teu nome estará, não neste túmulo, mas, no topo de um pedestal, onde a gratidão de todos os brasileiros te levará como reconhecimento. 

Getúlio, 

não tenho nem idéia, nem pensamento, nem força para falar. Estou vivendo, nesta hora, ao teu lado, o turbilhão das minhas emoções, que se agrupam entre espasmos de dor e lágrimas, entre conjecturas e dúvidas, e olhando para ti, sei que estou olhando para o Brasil e vendo que tu, ao entrares para a eternidade, tornaste maior o seu nome na História. Começo a pensar o que será de nós, os brasileiros, neste transe que se abre com a tua morte. 

Neste instante, quando ainda agitados pelo remorso ou atormentados e com as mãos tintas da traição, eu, receoso diante da afronta que se fez ao povo brasileiro com o teu afastamento do poder e da vida, a maior das afrontas que registra a história política do Brasil, porque se verificou não uma eleição com a tua morte, mas a consagração definitiva do amor do teu povo pelo teu amor pelo Brasil. Neste instante, diante do teu túmulo, não há lugar para exaltações, para paixões, o que ofenderiam a tua bondade, de que tanto se abusou neste País. Diante de ti não há lugar para recriminações. Há sim, para afirmar ao Brasil inteiro a mensagem de um homem que não queria morrer, mas continuar os seus ideais. Nós queremos, seguindo as tuas lições, um entendimento, mas fique bem claro que os entendimentos têm de se fazer entre os humildes, entre os trabalhadores, entre o povo e os homens capazes de assumir responsabilidades. 

Haveremos juntamente com aqueles que rendem as homenagens ao teu sentimento, de jurar fidelidade eterna, às idéias do teu amor, que desse túmulo emana, como disseste com teu próprio sangue, a flâmula da redenção, pela ordem, pela concórdia, pela paz. 

Getúlio, 

vamos encerrar o nosso despacho, a nossa conversa, aquela conversa que tinhamos tantas vezes por semana, em que tanto me inspirava, me aconselhava e decidia. É que procurei dar o melhor de mim mesmo pela sorte e pelos destinos do nosso País. Vamos encerrar a nossa conversa com a afirmação, ou melhor, com a informação que te costumava dar do que sinto, vejo e prevejo para o nosso País. Teremos dias intranqüilos, criados por aqueles que deveriam dar tranqüilidade, dias incertos, provocados por aqueles que disseram que iriam defender as leis, que são as que dão segurança à vida, do povo. Teremos dias de erros graves e de crimes, mas podes estar certo de que defenderemos a tua memória, porque tu não nos legaste a tua morte, mas a eternidade de tua vida. Podes ir tranqüilo, porque venceremos, inspirados em teus sentimentos de amor e igualdade. O teu apelo será atendido. Tudo faremos para atendê-lo, para que o Brasil viva dirigido não por ódios, por sentimentos subalternos, nem por vinganças ou recriminações, mas dentro da realidade generosa e fraterna. A tua vida é a maior lição que recebeu o Brasil. A tua morte é apenas um episódio da tua vida. Não chega nem a interromper o teu destino. 

O povo está falando nas ruas, com as suas lágrimas, com o seu desespero, com a sua inconformação. Tu ouviste aqui a voz dos trabalhadores pelos seus líderes, a voz de Minas demonstrando a sua fidelidade mais alta que suas montanhas, para te trazer, através dos nossos companheiros, de um daqueles que nos ilustravam a tua família governamental, a sua palavra de despedida. 

Eu, Getúlio, Não te dou minha despedida, pois que tu não te despediste de nós, por que nós iremos todos os dias, a ti, buscar inspirações para os nossos atos. 

Daquele que foi entre os brasileiros que eu conheci e entre os grandes homens com quem tenho convivido no mundo, um dos maiores, mais sem dúvida, o melhor entre os melhores. 

Não te trouxe o meu abraço que separa para sempre, e nem o meu abraço que une ainda mais, nem o beijo com que nos aproximamos dos mortos queridos, mais aquele aperto de mão amigo de todos os dias para que continuemos, tu na eternidade, eu nesta vida, o diálogo de dois irmãos ligados pela terra, pela raça, pelo serviço e pelo amor do Brasil.

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