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04/12/2015
O Presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha, é
acusado de graves atos delituosos: de beneficiário do Lava-Jato, de
contas não declaradas na Suiça, de mentiras deslavadas como a última
numa entrevista coletiva ao declarar que o Deputado André Moura fora
levado pelo Chefe da Casa Civil Jacques Wagner a falar com a Presidenta
Dilma Rousseff para barganhar a aprovação da CPMF em troca da rejeição
da admissibilidade de um processo contra ele no Conselho de Ética.
Repetidamente afirmou que a Presidenta em seu pronunciamento mentiu à
nação ao afirmar que jamais se submeteria à alguma barganha política.
Quem mentiu não foi a Presidenta, mas o deputado Eduardo Cunha. Seu
incondicional aliado, o deputado André Moura, não esteve barganhando com
a Presidenta Dilma, como o testemunhou o ministro Jacques Wagner. Vale
enfatizar: quem mentiu ao público brasileiro foi Euclides Cunha.
Imitando Fernando Pessoa diria: Ele, mentiroso, mente tão perfeitamente
que não parece mentira as mentiras que repete sempre.
É mentira que seu julgamento foi estritamente técnico. Pode ser
técnico em seu texto, mas é mentiroso em seu contexto. O técnico nunca
existe isolado, sem estar ligado a um tempo e a um interesse. É o que
nos ensinam os filósofos críticos. Ele deslanchou o processo de
impeachment contra a Presidenta exatamente no momento em que, apesar de
todas as pressões e chantagens sobre o Conselho de Ética,soube que na
votação perderia pois os três representantes do PT acolheriam a
aceitação de um processo contra ele, o que poderia, depois, significar a
sua condenação.
O que fez, foi um ato de vindita reles de quem perdeu a noção da gravidade e das consequências de seu ato rancoroso.
É vergonhoso que a Câmara seja presidida por uma pessoa sem qualquer
vinculação com a verdade e com o que é reto e decente. Manipula,
pressiona deputados, cria obstáculos para o Conselho de Ética. Mais
vergonhoso ainda é ele, cinicamente, presidir uma sessão na qual se
decide a aceitação do impedimento de uma pessoa corretíssima e
irreprochável como é a Presidenta Dilma Rousseff.
Se Kant ensinava que a boa vontade é o único valor sem nenhum
defeito, porque se tivesse um defeito, a boa vontade não seria boa,
então Eduardo Cunha encarna o contrário, a má vontade, como o pior dos
vícios porque contamina todos os demais atos, arquitetados para tirar
vantagens pessoais ou prejudicar os outros.
Seu ato irresponsável pode lançar a nação em um grave retrocesso,
abalando a jovem democracia, que, com vítimas e sangue, foi duramente
conquistada. Não podemos aceitar que um delinquente político, destituído
de sentido democrático e de apreço ao povo brasileiro, nos imponha mais
este sacrifício.
Faço um apelo explícito ao Procurador Geral da República, ao Dr.
Rodrigo Janot e a todo o Supremo Tribunal Federal: pesem, sotopesem e
considerem as muitas acusações pendentes contra Eduardo Cunha nas áreas
da Justiça. Estimo que há suficientes razões para afastá-lo da
Presidência da Câmara e que venha a responder judicialmente por seus
atos.
A missão desta mais alta instância da República, assim estimo, não
se restringe à salvaguarda da constituição e à correta interpretação de
seus artigos, mas junto a isso, zelar pela moralidade pública, quando
esta, gravemente ferida, pode constituir uma ameaça à ordem democrática
e, eventualmente, levar o país a um golpe contra a democracia.
Mais que outros cidadãos, são suas excelências, os principais
cuidadores da sanidade da política e da salvaguarda da ordem democrática
num Estado de direito, sem a qual mergulharíamos num caos com
consequências políticas imprevisíveis. O Brasil clama pela atuação
corajosa e decidida de vossas excelências, como ultimamente, tem
demostrando exemplarmente.
Leonardo Boff, ex-professor de ética da UERJ
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