Candidato ao STF fez uma demonstração rara de coerência e lembrou o
velho princípio de que um juiz precisa, acima de tudo, ser imparcial.
Nada mais atual.
Embora a oposição tenha feito o possível para transformar a sabatina
de Luiz Fachin num comício fora de hora e de lugar, a aprovação de seu
nome só foi possível porque o candidato ao STF colocou-se acima do jogo
baixo dos adversários e fez uma apresentação de alto nível na Comissão
de Constituição e Justiça do Senado. Após 12 horas de debates, leões da
oposição, como Aloizio Nunes Ferreira e Ronaldo Caiado, que abriram os
trabalhos tentando transformar a sabatina numa audiência pública de tom
inquisitorial, o que teria impedido qualquer debate produtivo, tiveram
de retirar-se exaustos e vencidos.
A batalha decisiva será travada na semana que vem, quando o plenário
do Senado aprova — ou não — a indicação de Facchin. Mas a lição de ontem
foi proveitosa por várias razões.
Ao falar de sua história de vida e de suas convicções, Facchin
mostrou que conhece fundamentos do Direito e que tem o que dizer sobre o
momento atual da Justiça brasileira.
Também respondeu de forma convincente à acusação de que, quando
procurador do Estado, desrespeitou a legislação do Paraná ao aceitar um
trabalho como advogado a serviço de uma causa privada. Explicou,
detalhadamente, que essa atividade era compatível com as regras vigentes
no momento em que prestou concurso para o serviço público — e que essa
visão foi confirmada por todas autoridades consultadas a respeito, a
começar pelos organizadores do concurso, onde foi aprovado em primeiro
lugar, aliás. Também deixou claro, com exemplos capazes de envergonhar
seus críticos e oponentes, que sua declaração de apoio a Dilma em 2010
foi parte de uma atividade política que já incluiu apoio a diversos
políticos, boa parte deles tucanos — como os ex-governadores José Richa,
do Paraná, e Mário Covas, de São Paulo, e ainda Gustavo Fruet, prefeito
de Curitiba e um dos principais microfones do PSDB na CPI da AP 470.
Mas ele soube fazer isso de forma discreta, sem assumir uma posição
defensiva, na posição de quem fazia a gentileza de esclarecer oponentes
mal-informados. Como se isso não bastasse, o apoio do senador Alvaro
Dias, um dos campeões de denúncia contra o PT na casa, contribuiu para
elevar sua cota de credibilidade.
Entrando no ponto substancial da sabatina, que consiste em definir
como pretende cumprir a tarefa de ministro do STF caso venha a ser
nomeado, Fachin foi preciso. Lembrou e repetiu, com frequência para
ninguém ter dúvidas, que o traço fundamental de um magistrado deve ser a
imparcialidade.
Com a cautela de quem jamais iria citar nomes nem mencionar casos
concretos — chegou a dizer que não iria fazer comentários sobre a AP 470
alegando que não estudara o caso com o devido cuidado — mas estava
disposto a fixar um princípio, ele tocou num assunto que tem toda
atualidade numa conjuntura na qual magistrados são aplaudidos na rua e
na mídia por assumir o papel de segunda voz da acusação. Isso já ocorreu
com Joaquim Barbosa na AP 470 e repete-se agora com Sérgio Moro na Lava
Jato.
Com um sorriso irônico nos lábios, Fachin deu uma definição precisa
daquilo que muitos comentaristas chamam de “consciência de juiz.”
Esclareceu que, em sua opinião, “a consciência de um juiz” é a própria
ordem jurídica, afirmação bem vinda num país onde, em 2012, era comum
ouvir ministros do STF dizendo que a “Constituição é aquilo que o
Supremo diz que ela é.” Na mesma linha, o ministro lembrou a importância
dos demais poderes da República, sublinhando a importância do Congresso
como expressão da vontade popular. Numa conjuntura na qual procura-se
colocar o Judiciário no centro das decisões políticas, Fachin lembrou
que a democracia é construída pelo convívio harmônico — sublinhou a
palavra — entre os poderes.
Luiz Fachin saiu da sabatina muito maior do que entrou. Apresentado
como um simples teleguiado que o Planalto tentava emplacar no Supremo de
qualquer maneira, despediu-se como um jurista de conhecimentos
eruditos, pontos de vista amadurecidos longamente, que formam um todo
que conversa entre si. Após o desempenho que Facchin exibiu ontem, ficou
difícil negar que tenha méritos para integrar o plenário do STF — o que
pode tornar bastante penoso o esforço dos adversários para arrebanhar
votos contra sua nomeação.
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