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14/12/2016
Ruffato, no El País: Temer entra para a história como demolidor da democracia
Por Fernando Brito
Sereno, equilibrado mas cheio de realidade crua, o artigo do escritor Luiz Ruffato, hoje, no El País.
Não sei se era esse o propósito do
presidente não eleito, Michel Temer, mas ele certamente fará jus, no
futuro, a mais que uma mera nota de pé de página nos compêndios de
História do Brasil, por seu papel fundamental na desestabilização do
frágil alicerce em que se assenta a jovem democracia brasileira. Eleito
vice-presidente, Temer conspirou, desde o primeiro dia, pela queda da
presidente Dilma Rousseff, objetivo alcançado um ano e meio após a posse
de seu segundo mandato, com o auxílio de um Legislativo corrupto e de
um Judiciário acovardado, e apoiado no egoísmo de uma classe média
branca ressentida. Temer contou ainda com a apatia atávica da maior
parte da população e com a inexistência de uma oposição organizada em
movimentos sociais e partidos políticos, desmoralizados, esses,
esvaziados e instrumentalizados pelo PT, aqueles.
Em seis meses, vimos Temer,
cinicamente alçado à condição de liderança anticorrupção, perder seis
ministros por envolvimento em denúncias de corrupção, além de ele mesmo
ter sido acusado por Marcelo Odebrecht, ex-presidente e herdeiro da
empreiteira, de ter intermediado o recebimento de R$ 10 milhões
destinados ao PMDB, segundo A Folha de São Paulo. Temer foi citado 43
vezes na delação premiada feita pelo ex-vice-presidente de Relações
Institucionais da Odebrecht, Claudio Melo Filho. O executivo mencionou
outras 45 vezes o nome do ministro Eliseu Padilha, da Casa Civil,
considerado por ele “preposto de Temer”: “Padilha concentra as
arrecadações financeiras do núcleo político do PMDB para posteriores
repasses”, explicou.
Recentemente, em uma das fazendas do ministro, em
Mato Grosso, alvo de duas ações do Ministério Público por degradação
ambiental, foram encontradas 18 espingardas… Melo Filho ainda arrola em
seu depoimento o secretário de Parceria e Investimentos, Moreira Franco,
e o líder do governo no Senado, Romero Jucá. Aliás, Padilha, Moreira
Franco e Jucá já foram ministros anteriormente: Padilha nos governos
Fernando Henrique Cardoso e Dilma Rousseff; Moreira Franco no governo
Dilma Rousseff; e Jucá no governo Lula…
Também em seis meses, vimos Temer,
autoritariamente, propor mudanças significativas em setores essenciais
como educação e saúde, visando o estabelecimento de um Estado mínimo,
como o preconizado pelo PSDB, derrotado nas eleições de 2014. A intenção
de Temer, de preparar o terreno para um possível governo tucano em
2018, esbarra, no entanto, no envolvimento das principais lideranças do
partido em denúncias de corrupção. Segundo o jornal Folha de S. Paulo,
depoimentos de executivos e diretores da Odebrecht citam o governador de
São Paulo, Geraldo Alckmin, codinome Santo, como beneficiário nas
planilhas da empreiteira. O senador Aécio Neves e o ministro das
Relações Exteriores, José Serra, já estão sob investigação da Operação
Lava Jato. E até hoje o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso não
esclareceu a denúncia da jornalista Miriam Dutra, que o acusou de usar
de um contrato fictício para enviar dinheiro para ela e seu filho no
exterior, e ele agora precisa explicar as doações ao instituto que leva
seu nome feitas pela Odebrecht.
Vamos terminar o ano com um
crescimento negativo do Produto Interno Bruto (PIB) estimado em 3,5%, ou
seja, completaremos dois anos consecutivos de recessão, algo inédito
desde a quebra da bolsa de Nova York, em 1929, quando a economia do
Brasil, em 1930 e 1931, encurtou 2,1% e 3,3%, respectivamente. Esse
fator, aliado à instabilidade política, provocada pelos sucessivos
escândalos envolvendo o governo Temer, levou o senador tucano, Tasso
Jereissati, um dos grandes empresários brasileiros, a afirmar que
“gigantes do mercado estão se perguntando se não é hora de deixar o
Brasil”. Ao invés de elucidar as denúncias que pesam contra ele, Temer
pensa em anular as declarações que o incriminam…
Michel Temer logrou ainda um grau de
impopularidade crescente em seus poucos meses à frente do Executivo.
Realizada ainda antes do depoimento de Melo Filho, pesquisa do Instituto
Datafolha mostra que o governo Temer é avaliado como ruim ou péssimo
por 51% dos entrevistados, regular por 34% e ótimo ou bom por 10% –
números que em julho estavam em 31%, 42% e 14%, respectivamente. Nem os
mais argutos futurólogos são capazes de prever o que irá acontecer com o
Brasil: renúncia de Temer até 31 de dezembro, como querem 63% dos
ouvidos na mesma pesquisa pela Datafolha, com exigência de eleição
direta para o cargo?; impeachment ou renúncia no ano que vem, com
eleição indireta pelo Congresso Nacional (neste caso, pergunta-se, com
que legitimidade?)?; ou ainda renúncia no ano que vem, com mudança
constitucional para possibilitar novas eleições, como quer o
ex-presidente Fernando Henrique?
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