20/11/2015
Olha aí, Dilma, como transformar o crime da Samarco em casas para o povo
Por Fernando Brito
Presidenta Dilma, sei que o exercício do Governo exige ponderação, regras, estudos de viabilidade, arcabouço legal, etc, etc, etc…
Mas exige, também, que o governante seja ousado, visionário, até um pouco delirante…
Se não fosse assim, não teríamos JK, Brizola, Darcy. Os mineiros não teriam tido Israel Pinheiro.
E os americanos não teriam tido o Roosevelt. Ali em cima estão as fotos do WPA, o Works Progress Administration, com Eleanor, sua mulher, à testa. Precisavam dar trabalho aos veteranos da Primeira Gerra e às vítimas do crash de 1929. E criaram os Civilian Conservation Corps,que estão ali, assentando blocos de calçamento. E também os desabrigados do Vale do Tennessee, onde o governo fez barragens. Lembram o pessoal do Vale do Rio Doce, rio que a Vale, privatizada, renegou até no seu nome, não é? Pois é, eles já foram assim, e não são mais.
Por isso, modestamente, quero dar um pitaco, destes de velho brizolista, que pensa fora da caixinha.
A essa altura, Presidenta, tem um monte de ONGs com as boquinhas mais abertas que os peixes sem ar do Rio Doce.
Mesmo como o acordo “camarada” com o Ministério Público, a Samarco – leia-se aí a Vale e os australianos da BHP Billiton – terão de pagar bilhões de indenização, uma parte deles que ficará na mão de gente bacana, consultores, homens do blá-blá-blá e burocratas. Vai ter um monte de “responsabilidade social”, que é aquele negócio em que a Samarco ganhava prêmios e publicações elogiosas da Fiesp, mas que não deu para instalar uma mísera sirenezinha para o pessoal de Bento Rodrigues poder fugir da lama.
Presidente, chame ao Palácio um cidadão chamado Ricardo Fiorotti Peixoto.
Ricardo é professor da Universidade Federal de Ouro Preto e chefia o Laboratório de Materiais da Construção Civil da Universidade Federal de Ouro Preto, ali pertinho do desastre, e o Reciclos, que é um grupo de pesquisa do CNPq-Capes que desenvolve conhecimento para transformar a lama de mineração em tijolos e argamassa.
Não são marqueteiros atrás de promoção, trabalham nisso faz tempo e tem muitos trabalhos e experiências publicados (aqui, aqui, aqui e aqui estão alguns) sobre a utilização de rejeitos de mineração (e de siderurgia em geral) na produção de blocos de alvenaria, de pavimentação, de argamassa e até de concreto para habitação e urbanização.
Eles têm sonhos e conhecimentos, mas não têm dinheiro nem meios de levá-los além de seu pequeno laboratório de experimentação.
Chame o Ricardo e sua turma e os desafie: vocês topam montar isso em escala industrial para um programa habitacional ali na região e na Grande BH, que estão a uma distância viável para o transporte do que produzirem?
Se ele vacilar, pergunte-lhe como é o lema da Escola de Minas, que ele integra. Eu já sopro para a senhora: “Cum Mente et Malleo“, com a mente e o martelo, conhecimento e ação.
Depois chame o Murilo Ferreira, da Vale, e algum Crocodilo Dundee da BHP e diga: “ó, cês vão pagar isso…” Não adianta chamar o presidente da Samarco, que é gravatinha contratado e daqui a pouco vai rodar, com um monte de indenizações.
E vão pagar também para fazer uma faixa de desapropriação em todas as margens devastadas do Rio Doce, de onde vai sair a lama e vai entrar o reflorestamento.
Vai ser trabalho por toda parte, Presidenta. Para tirar a lama, para transformar em tijolos, para assentar os tijolos em ruas e em casas, vendidos quase de graça, para produzir dezenas de milhões de mudas, para plantá-las. E se um dia a lama acabar, tem mais, vinda da mineração, que eles têm aos milhões de toneladas pendurada lá no alto dos morros.
Ah, e não esqueça de chamar o Levy, o Nelson Barbosa, a presidente da Caixa, o Ministro das Cidades e dizer-lhes: “olha, este pessoal é meu, não é docês”
Rompa a barragem da burocracia, Presidenta, a dos “técnicos” que fazem relatórios e pareceres que não levam a lugar nenhum.
Chame uns doidos, Presidenta, que ficam horas, dias, meses e anos estudando como fazer algo de útil do lixo da mineração e deixe os “sabidos” que têm sempre uma “placa de resistência” quando se trata de fazer alguma coisa.
O que eles nos deram foram um rastro de destruição e milhões de toneladas de lama. Então, Presidenta, pegue o pessoal que delira e que quer fazer o barro se tornar vida.
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