sexta-feira, 10 de junho de 2016

Nº 19.606 - "Governo Temer é a síntese do que pensa Eduardo Cunha, diz Dilma Rousseff"

Em entrevista exclusiva a Luis Nassif, a presidente afastada expôs o papel de Eduardo Cunha, Michel Temer, Aécio Neves e a Lava Jato no seu impeachment
 
Jornal GGN - "O governo Temer é a síntese do que pensa o Eduardo Cunha", disse a presidente afastada Dilma Rousseff sobre o desfecho do processo de derrubada do cargo mais importante da República, que começou com o PSDB em 2014, concluindo-se no movimento de centro-direita na ascensão do poderio de Cunha. Dilma também revela o papel da Operação Lava Jato, em entrevista exclusiva concedida a Luis Nassif, na TV Brasil.
Dilma Rousseff retorna dois anos atrás para explicar como Aécio Neves (PSDB-SP), a Lava Jato, Eduardo Cunha (PMDB-RJ) e Michel Temer conectam-se nesse processo de tentativa de destituí-la do poder.
A primeira das empreitadas partiu do candidato derrotado, Aécio Neves (MG), nas eleições presidenciais de 2014. "A reação foi bastante atípica em relação ao que vinha ocorrendo no Brasil. Ninguém nunca pediu recontagem de votos, ele pediu. Ninguém nunca pediu para fazer auditoria nas urnas eletrônicas, que são tidas no Brasil como uma das grandes e positivas ações que o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) realizou nesse país", lembrou, citando duas medidas tomadas pelo PSDB, ainda naquele ano, na insistência de não garantir à Dilma a conquista das urnas.
"Eu tinha de ser diplomada no início de dezembro. Mas em dezembro, eles entram no TSE alegando que a minha campanha tinha problemas e eu não podia ser diplomada", também mencionou, completando que a tentativa foi fracassada, porque o Tribunal aprovou as contas da presidente Dilma, realizando a sua diplomação no dia 18 de dezembro. Apesar da aprovação do Judiciário, o partido de Aécio não desiste e entra com outro pedido, no mesmo dia, de cassação da candidatura da chapa vencedora.
Paralelamente às tentativas da oposição, Dilma relata que toma rigidez um movimento do PMDB à direita, sob o comando explícito do deputado Eduardo Cunha (RJ). Essa mudança atingiu o seu sucesso na ascensão de Cunha à presidência da Câmara. Mas o início dessa mobilização, relembra a presidente, foi estruturada em anos anteriores.
"Começa o que eu reputo ter sido extremamente grave. Já no final do meu governo, nos dois últimos anos, você via uma movimentação muito atípica para a direita dentro do centro. O centro começa a, no início bem lenta, mas muito clara, a convergir para a direita", disse.
Citou a dificuldade enfrentada para aprovar dois projetos que trariam grandes benefícios ao Brasil: o Marco Civil da Internet e o Marco Regulatório dos Portos - este último, ainda, com grandes interesses do próprio peemedebista Eduardo Cunha.
"O que era a Lei de Portos? Tratava-se de abrir os portos para investimentos privados e renovar as concessões, através de processos públicos, do que havia de concessão extremamente antiga nos chamados portos públicos. Para aprovar isso, nós tivemos uma imensa dificuldade", disse a presidente, concordando que, por outro lado, Cunha tinha um papel de lobby muito forte na aprovação.
"Enquanto [Eduardo Cunha] era líder do PMDB, porque ele ocupa uma liderança da direita dentro do centro, ele leva o centro para a direita, uma parte expressiva do PMDB e dos partidos que orbitam no centro. Este processo culmina com a eleição dele [na Presidência da Câmara]. Nós tivemos uma derrota ali", afirmou.
Questionada se era viável abrir espaço de composição com Eduardo Cunha, como forma de garantir certa governabilidade, Dilma respondeu: "Sabe qual é o grande problema de compor com Eduardo Cunha? É simples. Ele tem pauta própria", negando.
"[O PMDB] adota uma das pautas dos polos. Isso ocorreu no governo do Fernando Henrique Cardoso e nos governos do PT. No momento em que o centro passa a ter pauta própria e é uma pauta conservadora e de negócios, fica muito difícil a relação com o centro", analisou Dilma.
E é nesse momento em que o então presidente da Câmara se vê em uma posição de domínio e controle sobre as pautas de seu interesse, diante do recuo do governo federal em negociar com o Legislativo, que Cunha passa a ser alvo de uma única obstrução ao seu avanço: torna-se investigado da Operação Lava Jato.
Para a presidente Dilma Rousseff, as investigações sobre os esquemas de corrupção da Petrobras a afetaram não diretamente, como analisam alguns jornais e especialistas: mas por colocar em risco políticos do Congresso, esses partidos tentaram negociar com o Planalto a impunidade como moeda de troca para salvar o seu mandato.
"Tem o efeito da Lava Jato, mas eu não acho que o efeito da Lava Jato seria o mesmo se o controle do centro estivesse em outras mãos", defendeu Dilma Rousseff. Para a presidente afastada, foram dois movimentos que indicam a sua tese: a revelação recente de que caciques do PMDB tentaram se evadir das investigações, conforme mostraram as gravações do ex-diretor da Transpetro, Sérgio Machado, e a chantagem explícita de Eduardo Cunha em seu processo de cassação na Câmara.
"Isso fica claro no processo de aceitação do impeachment. Porque tem muita gente que defende que nós teríamos que abrir uma negociação [com o PMDB de Eduardo Cunha], como se fosse algo da má vontade do governo, inclusive atribuía-se a mim não ter conversado com parlamentares, não querer negociar", respondeu a presidente.
"Não tem negociação possível com certo tipo de prática!", defendeu Dilma.
Expondo a chantagem feita por Eduardo Cunha, a presidente afastada conta que com o avanço das investigações da Procuradoria-Geral da República sobre o peemedebista, a reação do deputado foi: "'Ou vocês me dão três votos, ou eu aceito a questão que o Miguel Reale e a dr. Janaína entram naquele pedido de impeachment'", contou.
"Ora, [Cunha] faz isso de forma pública. Toda a imprensa relata. No dia em que [o governo] não aceita os três votos, o próprio Miguel Reale, ex-ministro da Justiça do sr. Fernando Henrique Cardoso, diz: 'trata-se de uma chantagem explícita'", completa.
Dilma, contudo, mantém cautela e não generaliza a atuação do deputado a todo o partido. "Eu não acho que o mesmo tipo de política você poderia considerar entre o PMDB do Senado, acho que ele é qualitativamente diferente. Eu não quero entrar em um personograma, mas é diferente. Não tem a mesma pauta, tem uma pauta mais progressista e tem um nível de discussão de outro patamar", afirmou.
Sobre o desfecho desse cenário de tratativas, iniciadas pelo PSDB logo após o resultado das urnas, em 2014, e seguidas pelo PMDB de Eduardo Cunha, o resultado visível, para Dilma, é o governo de Eduardo Cunha personificado na gestão do interino, Michel Temer.
"Está claro. O governo Temer é a síntese do que pensa o Eduardo Cunha. O governo Temer expressa claramente a pauta do Eduardo Cunha", afirmou, completando que pauta de interesses próprios "é do Eduardo Cunha, porque ele hegemoniza este grupo que constitui o governo Temer".
Em um dos exemplos de que o processo de impeachment foi a porta encontrada pelo interino Michel Temer para materializar a sequência do 3º turno, iniciada em 2014, Dilma citou um dos trechos em que é alvo do processo no Congresso:
"O plano Safra chega a ser ridículo, sequer eu assinei uma vírgula, porque não é o presidente que executa o Plano Safra. Ademais, eles dizem: 'a presidenta conversava muito com a pessoa, o secretário que geria o Tesouro e o plano'. E esse secretário era, segundo eles, o Arno Augustin. Ocorre que, em 2015, o secretário do Planejamento não era o senhor Augustin, mas era o atual Secretário Executivo em exercício do Planejamento, Dyogo [de Oliveira]", disse. "Um dos executores do Plano Safra é hoje ministro do Planejamento", rebateu Dilma Rousseff, com a conclusão: "Obviamente, neste processo, eles estão absolutamente conscientes que não tem base para impeachment".

Assista a entrevista completa:



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