segunda-feira, 26 de setembro de 2016

Nº 20.035 - "Paulo Pimenta: Uma cilada autoritária para privatizar a educação"

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26/09/2016

 

Paulo Pimenta: Uma cilada autoritária para privatizar a educação 

 

Portal Vermelho - 26 de setembro de 2016 - 12h42 

 

 

 
Uma proposta de transformação profunda na educação do país, sem dúvida, mereceria grandes debates, envolvimento da comunidade escolar e das universidades de todo país. Entretanto, o que se vê é mais um retrocesso em relação aos processos e às conquistas democráticas. Não se melhorar a qualidade da educação por meio de uma Medida Provisória, um instrumento que revela apenas o caráter profundamente autoritário dessa reforma. A formulação de políticas educacionais precisa avançar mediante aprofundamento do tema com a participação dos diversos segmentos sociais, de forma a contemplar a pluralidade e a diversidade de ideias.

Um dos pontos mais controversos dessa reforma diz respeito à organização curricular em áreas de conhecimento, com a primeira parte comum a todos os estudantes e a segunda específica segundo a escolha do/a estudante por uma das áreas de aprofundamento - linguagens, matemática, ciências da natureza, ciências humanas e formação técnica profissional. A retórica reformista é a flexibilização e o enxugamento de conteúdos de acordo com os percursos formativos. Porém, na prática esse modelo visa apenas à redução. O objetivo central da reforma está mais relacionado à lógica do mercado do que à expansão das fronteiras do pensamento.

Eis a cilada! Ao descartar grandes parcelas de estudantes do acesso pleno às diversas áreas do conhecimento, há uma condução para a formação técnica. A estruturação dessa oferta será feita por meio de contratos com organizações privadas de educação profissional. Os governos passam a comprar vagas nos cursos técnicos, reduzir quadro de profissionais da educação e abrir espaço para a atuação de empresa privadas. Certamente, essa reforma afetará as camadas sociais mais desprivilegiadas, que ficarão submetidas a um ensino meramente instrumental, modelo que se opõe e se impõe sobre uma concepção integrada do currículo escolar. Essa imposição compromete o princípio constitucional da igualdade de condições de acesso e permanência e de alcance dos níveis mais elevados de ensino.



Muitos educadores alertam para um retorno ao modelo da educação da Ditadura Militar quando o sistema educacional era organizado de forma paralela, para quem seguiria a formação técnica para o trabalho e para quem seguiria a formação clássica e científica. Outra grande cilada! Retorna-se à já superada ideia de que profissionais das áreas das ciências naturais e exatas não precisam aprofundar conhecimentos de ciências humanas, por exemplo, ou vice versa.

Esse modelo é mesmo que elimina da escola a liberdade de pensamento e concepções. É o modelo que, por meio de censura e repressão, impede a formação para a compreensão crítica da realidade social e para o exercício da cidadania.

A MP institui a jornada de tempo integral, mas expressa total distanciamento de toda a construção do país em torno do tema. A reforma não é perpassada por uma concepção de educação integral que fortalece as diversas dimensões do conhecimento e a vivência cidadã, por exemplo. Outro aspecto a ser criticado é a proposição isolada de organização curricular sem a articulação de medidas de assistência estudantil, o que constitui mais um fator de exclusão educacional. A expansão da carga horária e jornada integral refletem uma desvinculação com a realidade social, considerando que grande parte dos e das jovens entre 15 e 17 anos indicam a necessidade de estudar e trabalhar e que a MP não prevê bolsa de estudos para suprir tais necessidades.

Com essa reforma, o governo também possibilita que professores ministrem aulas fora de sua área específica de formação, a fim de suprir a falta de docentes em algumas áreas. A medida determina, ainda, que a Língua estrangeira obrigatória seja a Língua Inglesa. O Espanhol só poderá ser priorizado no caso de oferta de mais de uma língua estrangeira na instituição. Deixa de ser obrigatória a oferta dos componentes curriculares de artes, educação física, filosofia e sociologia.

Todas as mudanças correm alheias ao cotidiano das escolas, às discussões nas instituições formadoras e aos movimentos sociais representativos de diversos sujeitos e contextos sociais. Sem dúvida, essa política reformista é imposta pelo MEC por meio de MP porque sofreu quatro derrotas nas urnas. Ela não resultou de nenhuma deliberação das últimas conferências nacionais de educação e, portanto, não tem legitimidade. Trata-se de uma proposta ultraconservadora de avanço da gestão privatista na educação e que, ao longo dos últimos anos, já se introduzia por meio de projetos apresentados no âmbito estadual para assegurar parcerias entre o setor público e o privado. Sua forma autoritária é a expressão das práticas repressivas já usadas por governos reacionários contra os movimentos de ocupação de escolas e de greves de professores/as.

Sem o entrosamento com as reivindicações das diferentes juventudes e dos/as profissionais da educação, a reforma do ensino médio significará um golpe contra os processos democráticos de formulação das políticas educacionais e contra a busca por fazer da educação um instrumento de promoção da diversidade e da inclusão. 



Paulo Pimenta. Jornalista e deputado federal pelo PT do Rio Grande do Sul 
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