02/08/2016
Sobre as pessoas que não sabem sentir a dor alheia. Por Sidney Rezende
Anteontem, escrevi sobre o absurdo da grosseira observação de Michel Temer ao governador do Rio, Luiz Fernando Pezão, de que o câncer lhe “tinha feito bem”, o deixando “mais bonito”.
Ontem, retive minha vontade de dizer de novo uns desaforos, emocionados, porque o câncer levou, neste mesmo domingo que passou, a diagramadora Eunice Ribas Sanches, minha querida colega, em 1982, na velha Tribuna da Imprensa.
Mas hoje não vou me podar de reproduzir o texto de Sidney Rezende, que dá o tamanho do drama humano que o palerma metido a gracejador, usou como piada.
Câncer, não. Obrigado.
Sidney Rezende
Não. Não foi a “dentuça”. Foi o
presidente interino Michel Temer. E como foi ele, e não ela, o assunto
já é de anteontem e não merece tanta repercussão. Mas, na minha idade, a
memória fixa melhor quando o assunto é “antigo”. Se tivesse ocorrido
hoje, talvez, assim como a grande imprensa, eu também não lembraria
direito como aconteceu…
Como sabem, o governador licenciado
do Rio de Janeiro, Luiz Fernando Pezão, apareceu careca na inauguração
da Linha 4 do Metrô carioca por conta dos efeitos colaterais da
sistemática quimioterapia a que é submetido às segundas-feiras, no
tratamento de um linfoma não-Hodgkin, um tipo comum de câncer.
Ao encontrá-lo e buscando demonstrar o
quanto é afetuoso, Temer se superou: “Quero registrar a alegria de
reencontrar o Pezão. Até dizia a ele que existem coisas que parecem
maléficas que vêm para o bem. Vou tomar a liberdade de fazer um
comentário pessoal: Pezão, você está até mais bonito. Acabou sendo uma
coisa útil para o Pezão”.
Diríamos, no mínimo, que são daquelas
“vantagens” que, à exceção de Michel Temer, todos os demais “declinam”.
Os mais educados talvez sejam ainda polidos: “não, muito obrigado,
câncer, não! Agradeço. Passo”.
De acordo com o Inca, o câncer é a segunda maior causa de morte por doença no país (atrás apenas das cardiovasculares).
A estimativa de novos casos de câncer
para o Brasil, em 2016 (válida também para 2017), aponta a ocorrência
de 596.070 casos novos de câncer.
Excetuando-se o câncer de pele não
melanoma (aproximadamente 180 mil casos novos), ocorrerão cerca de 420
mil casos novos de câncer (214.350 em homens e 205.960 em mulheres).
O perfil epidemiológico observado
assemelha-se ao da América Latina e do Caribe, onde os cânceres de
próstata (61.200), em homens, e mama (57.960), em mulheres, serão os
mais frequentes.
O número de óbitos por câncer nos
últimos 10 anos, de 2005 a 2014 (ano mais recente disponível), de acordo
com o Sistema de Informações sobre Mortalidade, aumentou de 142.659
para 194.998 casos.
A possibilidade de cura ou sobrevida
do paciente depende de uma série de fatores, tais como o tipo e extensão
do tumor, se há ou não metástase e o estado geral do paciente, assim
como as doenças preexistentes.
Cerca de 50% dos casos, nos países
desenvolvidos, são curados. No Brasil, estima-se que este número seja
menor, pelo fato de os diagnósticos serem feitos mais tardiamente.
Em tempo, a Fundação do Câncer tem
como um dos seus grandes desafios pensar um projeto para melhorar a
assistência aos pacientes com câncer no Rio de Janeiro, que inclua desde
o diagnóstico precoce até a cura ou os cuidados paliativos. Já sobre a
brilhante folha de serviços do Instituto Nacional de Câncer José Alencar
Gomes da Silva – Inca, de tão longa, não dá nem para listar aqui.
Talvez antes de ir até a novíssima
plataforma do Metrô, o vice-presidente que caiu de paraquedas na cadeira
de titular no Palácio do Planalto devesse ir mais vezes visitar aqueles
que, no leito, lutam bravamente contra esta doença demoníaca. De
preferência, em silêncio. Até em respeito aos parentes dos pacientes e
aos seus compatriotas.
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