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12/09/2016
Um golpe à democracia e à soberania na AL. Por Eleonora de Lucena, apesar do Clarín
Do Tijolaço · 12/09/2016
Por Fernando Brito
A jornalista Eleonora de Lucena publicou, no Facebook, artigo que lhe foi encomendado pelo jornal argentino Clarín e não publicado porque lhe exigiram “amenizar” trechos. Especificamente,”não queriam que eu falasse em ‘submissão aos EUA”, diz ela.
Os pregoeiros da “liberdade de imprensa” em nosso continente são a favor da livre expressão do pensamento. Da do deles, é claro.
Republico o texto de Lucena, ótimo como sempre:
O julgamento de Dilma Rousseff
atropela a democracia e expõe de maneira crua o embate de interesses
antagônicos na América Latina. De um lado, um projeto de integração
regional sem submissão aos Estados Unidos; de outro, a volta das
conhecidas “relações carnais” com o império do Norte.
O governo de Michel Temer mostra que
quer esvaziar o Mercosul. Repetindo ardis usados internamente no país,
manobra para golpear essa construção da união sul-americana que vai
muito além de acertos comerciais.
De supetão, dá início a uma onda de
privatizações, vendendo um naco do pré-sal brasileiro, onde estão
valiosas reservas de petróleo. Tenciona desidratar e esquartejar a
Petrobras, ícone de uma proposta independente de desenvolvimento e
objeto de desejo de companhias estrangeiras.
Temer anuncia cortes em gastos em
saúde, educação e previdência. Planeja desmantelar conquistas
trabalhistas obtidas desde meados do século 20. Almeja transferir renda
dos mais pobres para os mais ricos: projetos sociais serão podados para
garantir o pagamento dos juros estratosféricos pagos à elite.
É a reedição de um enredo já
desenhado no Paraguai e em Honduras: um golpe sem tanques que corrói as
instituições para minar a independência. Num ritual kafkaniano,
políticos acusados de corrupção votam a cassação de uma presidente que
todos reconhecem ser honesta.
Nos anos 1990, com governos
neoliberais, a América Latina experimentou uma combinação de
concentração de renda, desindustrialização, privatizações selvagens e
perda de soberania. A Argentina viveu com radicalidade esse processo.
Nas ruas, o derrotou.
Agora, as mesmas armações daquele
tempo tentam ressuscitar no continente. Aproveitam a situação adversa na
economia e disseminam um discurso de ódio, preconceito e intolerância.
Conquistam, assim, fatias das classes médias, muitas vezes refratárias à
ascensão que os mais pobres obtiveram nos últimos anos.
O movimento precisa ser entendido
dentro da atual crise capitalista e das mudanças na geopolítica mundial.
O capital financeiro busca garantir ganhos na América Latina.
Necessita
derrubar barreiras de proteção na região _o que é mais viável com
governos dóceis, também dispostos a vender ativos a preços baixos.
Enquanto se atolavam na guerra do
Iraque e adjacências, os EUA viram a influência da China crescer de
forma exponencial no continente sul-americano. O petróleo, os minérios, a
água, os mercados internos, as empresas inovadoras _tudo é alvo de
interesse externo.
Nesse contexto de disputa é que devem
ser analisadas as intenções norte-americanas de instalar bases
militares na Argentina _na tríplice fronteira e na Patagônia. O império
volta a se preocupar com o que considera o seu eterno quintal.
O impeachment de Dilma é peça chave
no xadrez de poder da região. Afastar quem não se submete a interesses
dos EUA será uma advertência aos países. O processo, que deixa as
instituições brasileiras em farrapos, demonstra, mais uma vez, como a
voracidade dos mercados e a força imperial são incapazes de conviver com
a democracia.
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